CHESF, Furnas e Eletronorte estão fora do próximo leilão de LTs

19 de julho de 2012

O edital do próximo leilão de transmissão, que está em audiência publica, traz uma regra que limita a participação de empresas que registram problemas frequentes com cronogramas de obras. A restrição vale para quem registrar atraso médio superior a 180 dias, considerando-se projetos em andamentos e concluídos nos últimos três anos; e, ao mesmo tempo, acumular três ou mais penalidades já transitadas em julgado na esfera administrativa da Aneel por esses atrasos.

A novidade fez com que o diretor de Engenharia da Chesf, José Aílton de Lima, fizesse cruzamentos de informação para chegar à conclusão de que Chesf, Eletronorte e Furnas – três empresas do Grupo Eletrobras – serão afetadas pela medida. Com isso, as estatais poderão ter participação máxima de 10% em consórcios fechados para a disputa.

O executivo, que falou com exclusividade para o Jornal da Energia, adota uma postura crítica em relação à proposta da Aneel e argumenta que as estatais têm ajudado a elevar os deságios nos certames. Ele também lamenta que a punição venha logo depois de uma portaria interministerial que visa facilitar o licenciamento ambiental de linhas de transmissão.

Para Lima, é justamente o processo junto aos órgãos ambientais que tem causado os atrasos. E as estatais ficariam de fora de um certame no qual essa nova legislação já está valendo. “Na hora em que o regulador muda os processos, para simplificar, somos punidos”, conclui.

ICGs foram a gota d´água para a Aneel (foto Jornal da Energia)

Confira abaixo a íntegra da entrevista.

Quais são as empresas que devem ficar de fora dos certames com essa nova regra?

José Aílton de Lima: Chesf, Furnas e Eletronorte, as três empresas do Grupo Eletrobras.

O que significa essa decisão para a Chesf?

José Aílton de Lima: Primeiro vamos analisar a evolução das disputas nos leilões de transmissão. Até 2002, as empresas estatais estavam proibidas de disputar esses certames. Até aquele ano, os deságios nos leilões ficavam entre 10% e 15%. A partir de 2003, com a entrada das estatais federais nos certames, a concorrência ficou mais acirrada e os deságios pularam para um patamar de 40%.

Isso quer dizer que sem as grandes estatais,como a Chesf, não haveria disputa?

José Aílton de Lima: Sem sombra de dúvidas a concorrência será limitada. Particularmente nos próximos leilões de transmissão, do Pré Belo Monte, como é conhecido. Pois grande parte dos lotes está na área de atuação da Chesf e da Eletronorte.

 

O sr. acredita que essa decisão teve objetivo de vetar a Chesf, uma vez que a empresa já sofreu críticas da Aneel por atrasos?

José Aílton de Lima: O papel da Aneel é zelar para que a concorrência se estabeleça de fato, sem conluios entre os agentes econômicos, como forma de baixar os preços públicos associados aos sistemas elétricos. Num segundo momento, a Aneel tem que zelar para que os empreendimentos sejam implantados nos prazos estabelecidos nos contratos de concessão. Para esse segundo momento, a Aneel dispõe de instrumentos como multas e garantias que são exigidos dos empreendedores.

 

Se a empresa não cumpre o cronograma não é justo que ela seja vetada dos próximos certames?

José Aílton de Lima: Existem diversos motivos para uma empresa não cumprir os prazos do contrato de concessão. Pode ser por falta de capacidade de gestão, por dificuldades para levantar os recursos financeiros, por dificuldades no licenciamento ambiental, por falência das empresas contratadas para construir e outros.

No caso da Chesf a razão mais forte, que tem o maior peso no atraso dos empreendimentos tem sido as dificuldades no licenciamento ambiental. Cerca de 70 a 80% por cento de nossos atrasos decorrem desse fato. São situações que independem da vontade dos empreendedores. Tanto é verdade que a própria Aneel reconhece que mais de 50% dos empreendimentos de transmissão ou estão atrasados ou serão entregues com atraso.

A Aneel está fechando os olhos para os problemas do licenciamento ambiental e colocando todos os atrasos na conta do empreendedor. Como agência reguladora, ela deveria se debruçar melhor sobre as causas dos atrasos.

 

Acredita, então, que a Aneel está sendo injusta com a Chesf?

José Aílton de Lima: Não se trata de ser justa ou injusta com a Chesf. Trata-se de desempenhar o papel institucional de regulação do mercado, de forma a fazer os preços públicos caírem. Ao restringir a concorrência ela poderá restabelecer o ambiente que havia até 2002. Entretanto, não cabe à Chesf fazer o julgamento dessa questão. Isso cabe ao Congresso Nacional e subsidiariamente ao TCU, que devem zelar pela correta aplicação da Lei 8.666/93 (que estabelece normas para licitações na administração pública).

 

O sr., então, ficou insatisfeito com a posição da Aneel nesse episódio?

José Aílton de Lima: Nossa relação é institucional e republicana. Como agente empreendedor, a Chesf tem o direito de externar suas posições e defender seus interesses. Os resultados dos leilões é que mostrarão se esse posicionamento tem consistência ou não.

 

A Chesf não teria interesse de entrar com a participação de até 10% que a Aneel permite?

José Aílton de Lima: Não. Acho que entrar com 10% é uma desmoralização.

 

Se os atrasos são culpa do licenciamento… acredita que eles podem continuar a acontecer, mesmo com essa medida da Aneel?

José Aílton de Lima: Sim, claro. Está havendo atrasos com outros empreendedores também, não só com a gente. Todos empreendimentos estão atrasados no Brasil. E a maior parte deles é no licenciamento ambiental. E isso não vai ser alterado.

 

O governo não publicou uma portaria interministerial para facilitar o licenciamento?

José Aílton de Lima: Essa portaria ainda não foi aplicada em nenhum empreendimento, porque, para os projetos em que o licenciamento já estava em curso, vale a regra passada. Ficamos fora do teste da nova regra, que poderia ajudar. É mais uma coisa que de certa forma é constrangedora. Na hora em que o regulador está mudando os procedimentos para simplificar, nós somos punidos.

 

O fato de as empresas vetadas serem todas estatais não é justamente por elas serem estatais? Não é um outro ritmo, com licitações, etc?

José Aílton de Lima: Veja… ser uma estatal é uma realidade, e nós seguimos a lei 8.666/93. Tenho que seguir todos procedimentos da lei. Na minha visão, isso não inviabiliza, não. O que o poder público tem que fazer é dar a mesma condição a todo mundo. Querer que a Chesf tenha a mesma velocidade de resposta que uma empresa privada é absurdo. Agora, acho que as estatais têm um papel importante na economia, porque elas regulam o mercado. São a mão forte do governo para regular o mercado, e a Aneel parece que fechou os olhos para isso. Elas terminam aumentando a competição.

No fundo, é a tese que coloco o tempo todo. O grande problema do Brasil é baixar preços para se tornar um País mais competitivo. Essa medida trabalha contra essa política de governo. O leilão tem que contemplar essa realidade e não querer me tratar igual uma empresa privada. Não somos, somos estatal, temos uma série de limitações. Mas isso não impede que a gente seja competitivo, eficiente, eficaz, que a gente faça projeto com qualidade e responda em determinados momentos em que o governo precisa.

Houve leilões em que, se não fossem as estatais, daria vazio. Não sou contra a lei 8.666/93. Acho que a Aneel deveria se debruçar sobre o problema e olhar com calma todas as causas de atraso para ver que eles estão em questões que não dependem dos agentes.

Deixe seu comentário:

© 2015 RioGrandedoNorte.Net - Todos os Direitos Reservados

O RioGrandeDoNorte.Net seleciona as notícias mais importantes da semana a partir das mais confiáveis fontes de informação setorial. Em algumas delas, agregamos o noticiário de um assunto em um só item, ressaltamos (negritando) ou até comentamos (grifando) a notícia original, caso pertinente.