Deu no caderno Natal da Tribuna do Norte:
Onde você mora? A frase, aparentemente fácil de responder, deixa em dúvida quem reside em bairros como Nova Parnamirim, Neópolis, Guarapes, Nossa Senhora da Apresentação, Pitimbu ou Igapó. Em tom de brincadeira, alguns respondem dizendo que moram no “nem”. “Nem é Natal, nem é Parnamirim”, por exemplo. Com o processo de conurbação na Região Metropolitana de Natal (RMN), vivenciado desde a década de 70, os limites entre os municípios ficaram mais difíceis de definir. Em alguns casos, é preciso consultar as linhas imaginárias que cruzam os mapas geográficos para saber qual município estamos.
A falta de um planejamento integrado entre os municípios que compõem a região acaba gerando problemas para os munícipes, além disso, deixa dúvidas com relação ao futuro dos investimentos necessários no local. A lei que criou a RMN também fixou a fundação do Conselho de Desenvolvimento Metropolitano, no entanto, desde 2008 não há nenhuma reunião do órgão que é presidido pelo Governo do Estado. De acordo com Maria do Livramento Clementino, professora do Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e coordenadora do Núcleo Natal do Observatório das Metrópoles, a aproximação entre os municípios acaba gerando conflitos, “principalmente para a população no que diz respeito aos serviços urbanos, como coleta de lixo, por exemplo. Para o cidadão metropolitano, a questão precisa ser resolvida”, explica.
A TRIBUNA DO NORTE percorreu alguns bairros de Extremoz, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante e Macaíba que fazem divisa com Natal. Estas cidades, aliás, são as primeiras incluídas na RMN. Nos últimos anos, mais quatro municípios (Nísia Floresta, Ceará-Mirim, São José do Mipibu e Monte Alegre) foram incorporados. Entre os moradores, as histórias se repetem. O Código de Endereçamento Postal (CEP) é do município menor, mas é em Natal onde as compras são realizadas, o médico é procurado e até mesmo o voto é computado.
Segundo Livramento, é necessário um planejamento ou pacto territorial mais amplo. “O prefeito de uma região metropolitana não pode trabalhar apenas com a agenda do município dele, é preciso duas agendas. Existem os problemas de interesse comum. A Constituição Brasileira indica esses problemas e alguns não foram resolvidos, como a segurança pública. Apesar de não ser uma questão de ordem do Município, o prefeito não pode se abster”, conta.
Os prefeitos dos municípios da RMN são unânimes em afirmar que o crescimento urbano é muito mais veloz, e bem maior, que o aumento da receita. Ano passado surgiu a ideia de criação de um Fórum Permanente de Prefeitos da Grande Natal para discutir interesses da região, no entanto, nada foi feito. E se depender das propostas apresentadas pelos atuais candidatos a prefeito, o assunto estará fora da agenda pelos próximos quatro anos. “Existe a necessidade dessa questão se tornar importante. Diz respeito não somente à realidade de hoje, mas ao futuro. Os prefeitos precisam conseguir visualizar a região metropolitana. Não é questão política, mexe com as tarifas, água, transporte, questões vitais para nossa existência”, alerta a professora.
Vida urbana e rural se misturam na Grande Natal
A BR-101 Norte, ou avenida Coronel José Franco, separa os moradores de São Gonçalo do Amarante e Natal. De um lado, bairro Nossa Senhora da Apresentação, zona Norte da capital, do outro, área rural do município vizinho. No lado natalense, o serralheiro Elino Montenegro, 63 anos, conta que a dificuldade no local diz respeito à saúde, especificamente com relação ao atendimento em casos de emergência. “O problema aqui é maior quando acontece algum acidente. A gente liga para o Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] e eles não dão certeza porque diz que aqui é responsabilidade de São Gonçalo”, afirma.
Na frente da casa de Elino, já em São Gonçalo do Amarante, reside José Salvador de Freitas, 55 anos. Atualmente desempregado, Salvador conta que “nasceu e se criou” no local. “Mas eu resolvo tudo em Natal mesmo. Compras do supermercado, por exemplo, faço aqui na zona Norte”, revela. Um pouco mais à frente, na mesma rodovia, o agricultor Nilson Batista, 64 anos, tenta atravessar a pista com um jumento, uma vaca, uma novilha e um bezerro. Quando não está cuidando dos animais, Nilson recolhe lixo em Natal. “Moro por aqui, mas sempre vou a Natal. Morava lá, mas preferi vir para cá”, conta.
Falta de estrutura e de serviços básicos
A ponte sob o rio Guarapes divide os municípios de Natal e Macaíba. O bairro que leva o mesmo nome do rio e é cortado pela BR-226, apresenta uma série de problemas estruturais. Ruas esburacadas, falta de coleta de lixo estão na lista de reclamação dos moradores. Há problemas também com relação à segurança. Defeitos que, nos últimos meses, são alvos de ataques e promessas dos candidatos a prefeito e vereador. Devido à proximidade entre as duas cidades, os moradores recebem a visita de candidatos natalenses e macaibenses.
A aposentada Juditi de Oliveira, 64 anos, há 45 mora na mesma casa localizada à beira da BR-226, na avenida Presidente Raniari Mazzilli. Juditi conta que vota em Macaíba, mas é em Natal onde resolve os problemas que aparecem. “Vou mais à Natal do que à Macaíba. Gosto de morar aqui, acho tranquilo, não penso em mudar”, analisa.
Juditi tem quatro filhos. Um deles mora com ela, outro, é vizinho. “Mas ele mora do outro lado, em Natal. Aqui, para mim, é Macaíba. Natal é do outro lado da pista”, explica. “Eu queria que os problemas fossem resolvidos, independente de qual município. A coleta de lixo atrasa e as ruas ficam sujas. Não tem abastecimento de água e a violência é preocupante”, resume a aposentada.
O endereço é de Extremoz, mas os serviços de Natal
A placa na beira da estrada anuncia que estamos chegando ao município de Extremoz. A comunidade de Campinas, próxima à praia de Jenipabu, é mais uma localidade onde os moradores dividem os afazeres do cotidiano entre a capital e o município de origem. A estudante Thaise Vitória, 18 anos, vai todos os dias ao bairro Pajuçara, zona Norte de Natal, assistir aulas na escola. “Aqui só tem escola do ensino fundamental, por isso tenho que ir à Natal”, revela.
O agricultor Oscar de Brito, 57 anos, diz que mora em Campinas “desde que nasceu”. Foi lá onde criou os quatro filhos e espera ficar “até me mudar para o cemitério”, conta. O homem também revela que sempre vai à capital “para resolver problema de saúde e visitar meus irmãos”.
Na mesma comunidade, mora a agricultora aposentada Rosinete das Flores, 59 anos. O cotidiano na localidade vizinha a uma das praias mais famosas do Rio Grande do Norte, segundo a dona de casa, é tranquilo. “Não gosto de ir à praia. Prefiro ficar em casa mesmo. Em Natal eu vou sempre. Meu dinheiro eu recebo lá. Vou à supermercados no bairro Parque das Dunas e, de vez em quando, vou ao Alecrim comprar algumas coisa que esteja faltando em casa”.
N. Parnamirim: “Aqui é o meio do mundo”
É Natal ou Parnamirim? Para a resposta, o militar aposentado Eronide de Souza, 74 anos, tem a seguinte resposta: “Aqui é o meio do mundo. Só é ruim para os candidatos que ficam sem saber onde pedir voto”, diz. Eronide é um dos moradores de um condomínio localizado à rua São João Del Rey, que marca a divisão entre as duas cidades. De um lado, Nova Parnamirim, do outro, o bairro de Neópolis.
O aposentado diz que mora “na parte da rua que é de Parnamirim”, desde 2002. O título de eleitor é de Natal. O fato de morar na divisa entre as duas cidades, segundo ele, é positivo. “É bom porque tem dois postos de saúde perto daqui. Um é de Parnamirim, o outro é de Natal. O único problema é quando chove. Fica tudo alagado”, explica.
O bairro de Nova Parnamirim é um dos que mais cresce nos últimos anos. A expansão imobiliária convive com outro crescimento: o surgimento de empreendimentos comerciais e serviços. Até o fim deste ano, grandes marcas de varejo e atacado, como Walmart, Nordestão e Pão de Açúcar estão se instalando onde já existem indústrias do setor têxtil, alimentício e de veículos, além de transportadoras. Redes de shopping centers, como o Iguatemi e um grupo português, também apresentam interesse.
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