Deu no caderno de economia da Tribuna do Norte:
Braços cruzados, cadeiras nas calçadas, carros enfileirados nas ruas do Alecrim, todos com letreiros de vendas, à espera de comprador. A inércia na chamada “Pedra”, da avenida 10, em Natal, dá mostra de que a venda de carros usados estacionou nos últimos meses. O cenário se repete nas lojas, com pátios lotados de veículos “encalhados” há mais de um mês. Enquanto quem vende novos comemora o movimento com a redução do Imposto do Produto Industrializado (IPI) – prorrogada por mais 60 dias -, o setor de seminovos e as lojas de motos pisam no freio.
Dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) mostram que o número de veículos novos emplacados avançou 20%, em agosto no Rio Grande do Norte. Na contramão, os usados, desde novembro, amargam queda nas vendas, em torno de 15%, em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados são da Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto).
A retração – agravada com a pre-ferência do consumidor pelo carro zero com preços mais baixos – tem origem com a mudança nas regras para contrair financiamento. Os bancos alteraram as regras e o acesso ao crédito para a compra de veículos de duas e quatro rodas ficou mais difícil.
A inadimplência recorde no fi-nanciamento de veículos para pessoa física ajuda a explicar isso. De acordo com o Banco Central, a taxa chegou a 6,1% em maio, ante 5,9% em abril. No mesmo período do ano passado, o índice de atraso no pagamento estava em 3,6%.
“O rigor no crédito está fechando portas. No país já são 4,5 mil lojas a menos e 20 mil desempregados em média”, observa o presidente da Fenauto, Ilídio Santos. Da média de 45% de aprovações nos pedidos, hoje apenas 20% em média recebe o aval dos bancos.
No Estado, segundo o Sindicato de Revendedores de Carros Usados do RN, cerca de 10% de 360 lojas também encerraram as atividades. A média de vendas do setor era de 3,5 mil veículos por mês até junho. Desde então, com o imposto reduzido para os novos, não ultrapassa os 3 mil/mês. “O prejuízo ainda não foi calculado, mas é notória a queda nas vendas. As dificuldades impostas pelas financeiras pioraram com a medida do governo para o imposto”, conta o presidente do Sindicato, George Barbosa.
Com o IPI menor para os novos, houve uma desvalorização de 10% a 15% no preço dos usados. Isto porque, o preço dos seminovos se baseia na tabela dos 0km.
O proprietário de loja na Bernardo Vieira, Leonardo Isler, lembra que há cinco meses era possível comprar um seminovo, modelo honda civic, por R$ 62 mil para revender por R$ 65 mil. Com a queda do IPI que deixou o mesmo carro, só que novo, na média de R$ 60 mil, o carro usado passou a ser revendido por R$ 55 mil – uma defasagem de até R$ 7 mil, do valor adquirido. “Falta carro para estoque, mesmo a gente comprando mais caro para revender”, diz. Antes a loja trabalhava com estoque de 30 veículos por loja. A solução encontrada para não amargar o prejuízo foi passar a trabalhar com picapes, que não tem desvalorização com o mercado aque-cido pela redução do IPI, observa Isler.
A projeção para o segundo semestre de 2012, explica George Barbosa, é de crescimento tímido entre 4% e 6% em relação ao desempenho dos primeiro seis meses desse ano e um recuo em torno de 2,5%, se comparado ao mesmo período do ano passado.
Em agosto, o mercado já começou a reagir. Mais otimista, Moacir Potiguar, do Natal Auto Shopping, aponta uma recuperação de 80% ante a julho. “Mesmo com a crise estamos conseguindo vender. Os seminovos tiveram queda média de 12% e tem atraído o consumidor”, disse.
No mercado da pedra, “vendas nunca foram tão difíceis”
O cruzamento entre as avenidas Presidente Sarmento e Leonel leite, no Alecrim, é também conhecido como o mercado da “pedra” da avenida 10. No local, vendedores avulsos encostam carros com preços, modelos e anos variados para vender. É o caso do aposentado Olacildo Moura Barros, 62 anos, que há um mês e meio tenta repassar um veículo. Trabalhando há três anos no setor, ele conta que “nunca foi tão difícil vender como nos últimos meses”. Antes, ele comercializava um carro a cada 15 dias. “Teria vendido três ou quatro. E está aí, fica todo mundo esperando (comprador) e não aparece”, diz apontando para outros colegas que também enfrentam dificuldades para tocar o negócio informal.
Há um ano, conta ele, o comprador conseguia só com o comprovante de residência e um contracheque aprovar crédito, parcelar em 60 vezes, sem entrada. “Hoje é uma burocracia de documentos e é mais difícil conseguir financiar”, diz.
Antônio Cabral, que tem loja no cruzamento, prefere aguardar o fim do IPI reduzido, para tentar vender os veículos no preço “justo”. Mas nem todos estão reclamando. “O fluxo na vendas permanece o mesmo para quem trabalha com estoque próprio”, explica Márcio Dantas, que também tem loja de usados na Leonel Leite.
A prorrogação do IPI deverá causar maior quebradeira e trazer prejuízos para os vendedores avulsos. “Se prolonga a redução, prorroga também as dificuldades para esses segmentos”, diz o economista e professor do cursos de gestão financeira da UnP, Marcos Alves.
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