Daniel Turíbio

Daniel Turíbio é jornalista da agência Smartpublishing Mídias em Rede. Já trabalhou com mídia impressa, rádio e assessoria de comunicação. Reside em Natal/RN.

Corregedor exonerado investigava violência e corrupção da polícia

15 de junho de 2012

Um servidor dedicado, que estava cumprindo com suas obrigações, realizando um trabalho exemplar mas que terminou sendo despedido de uma forma supreendente e estranha. É assim que membros do judiciário e de entidades ligadas aos Direitos Humanos no Rio Grande do Norte qualificaram o advogado Francisco de Sales Felipe, exonerado do cargo de corregedor-geral da Secretaria Estadual de Segurança Pública e Defesa Social (Sesed). Nenhuma das fontes ouvidas pelo Diário de Natal classificou como acertada a saída de Francisco do governo, assim como também não aceitaram a justificativa da Sesed. De acordo com o secretário de segurança Aldair da Rocha, o corregedor “não estava atendendo às expectativas da secretaria”. A declaração foi emitida através de nota à imprensa.

Wendell Beethoven: "Ele estava investigando casos de violência e corrupção". (Foto: Paulo de Sousa/DN/D.A Press)

A saída de Francisco de Sales ainda está sob desconfiança. De acordo com uma fonte, que não quis se identificar, a suspeita de que o ex-corregedor estaria sofrendo pressões dentro da Secretaria de Segurança é verídica. Ele seria o “suspeito nº 1” pelo vazamento de informações à imprensa acerca de investigações sobre o envolvimento de policiais em crimes, como no caso publicado por um jornal local  no dia 8 de abril em que denúncias vindas da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República apontavam a participação de delegados em crimes como extorsão, assassinato e tráfico de drogas. A atuação do corregedor teria teria desagradado integrantes da segurança pública no RN. “Foram abertos dois inquéritos. Um para apurar quem fez a denúncia anônima na Secretaria de Direitos Humanos e outro para saber quem vazou a informação. E Francisco era o suspeito número 1. Desconfiam que foi ele porque sabem que a denúncia estava escondida na secretaria por mais de um ano e só chegou à corregedoria porque ele foi buscar”, contou a fonte. A Sesed foi procurada mais uma vez para comentar o fato, mas se negou a dar mais esclarecimentos sobre o caso, limitando a reforçar a posição de que o corregedor não cumpriu as expectativas. A reportagem tentou por várias vezes o contato com o ex-corregedor geral da Sesed, mas ele não atendeu as ligações.

“TEVE ALGUM OUTRO MOTIVO PARA SAÍDA”, DIZ PROMOTOR

Para o promotor de investigação criminal Wendell Beetoven Agra, a exoneração de Francisco de Sales é uma grande perda para segurança pública do Estado. “Ele tirou a corregedoria do estado de inércia que estava há muito tempo. Quem perdeu foi a segurança pública. Junto com a Polícia Militar, a corregedoria era a única que estava funcionando bem. Lamento muito esta atitude do governo”, comentou o promotor, que também é coordenador do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público do RN. Ainda de acordo com Beetoven, a afirmativa do governo de que o exonerado não cumpria com as expectativas passa longe da realidade do trabalho feito pelo advogado, acompanhado de perto pelo promotor. “A relação de Francisco com o MP era excelente. Dizer que ele não estava cumprindo as expectativas é levantar uma questão: a segurança pública do RN está atendendo as expectativas, se está tão mal? Fico muito surpreso com a saída dele. Um homem corajoso, que estava investigando vários casos de violência e corrupção cometidos por policiais e enfrentando interesses corporativistas dentro da segurança pública.

Esta justificativa do governo não esta parecendo a verdade para mim. Se uma ida à Brasília, para a Secretaria de Direitos Humanos, não é aceita algo está errado”, afirmou o promotor, citando a viagem do corregedor até a SDH para audiência com a ministra Maria do Rosário. Segundo informações extra-oficiais, Francisco teria ido relatar crimes cometidos por integrantes da segurança pública potiguar. O promotor ainda exigiu que os esclarecimentos sejam feitos em relação à exoneração.

“Teve algum outro motivo para saída de Francisco da corregedoria. Eu e a sociedade queremos saber. É fato que investigação interna atrai reações corporativistas e um bom trabalho bate de frente com maus profissionais. Se isso foi a causa, quem assumir agora tem a percepção que não pode ir atrás dos maus profissionais. Assim, a nossa segurança pública, que já vai mal, fica ainda pior”, pontuou Wendell Beetoven.

ADVOGADO ESCREVEU CARTA LAMENTANDO DECISÃO

Praticamente repetindo as palavras do promotor, o o advogado e integrante do Conselho Estadual de Direitos Humanos Marcos Dionísio Caldas lamentou a saída de Francisco de Sales da corregedoria da segurança pública do RN. “Francisco é um profissional honesto, corajoso, combativo. Sua história mostra isso. Se ele não estaria cumprindo as metas ou cumprindo as expectativas, como foi dito, o que temos a dizer do governo e da sua segurança pública?”, frisou Dionísio.

O advogado ainda escreveu uma carta lamentando  a exoneração. Em um dos trechos afirma que Francisco trabalhou enfrentando dificuldades, corporativismo e a falta de apoio. “Sua exoneração torna mais pobre o serviço público estadual e a Secretaria de Segurança perde um servidor que em muito poderia auxiliá-la a descortinar um pouco de luz em meio a tantas trevas, inoperância e resultados pífios”, escreveu o ativista dos direitos humanos. Na condição de ex-ouvidor e tendo acompanhado boa parte do trabalho de Francisco de Sales à frente da corregedoria, por vezes em trabalhos conjuntos, Geraldo Soares Wanderley também mostrou-se surpreso com a exoneração.

“Até agora não sei a razão da saída dele. Até onde sei e acompanhei, Francisco estava cumprindo a sua função a contento. Inclusive fez trabalhos importantes, resgatando recomendações que fiz ao governo sobre denúncias de violações dos direitos humanos por parte de policiais. Sempre se mostrou compromissado e atencioso com o trabalho.

Foi uma exoneração muito estranha”, declarou Wanderley, que integra o Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp). O ex-ouvidor suspeita de que investigações que envolvem delegados da Polícia Civil em crimes, aberta após denúncia vinda da Secretaria de Direitos Humanos, podem ter motivado a saída de Francisco Alves. “Na época que recebi o ofício da SDH percebi que tinha muitos indícios graves e encaminhei, sigilosamente, para o então governador (Iberê Ferreira), para a Sesed e para o Ministério Público.  O documento de Brasília citava que algumas das denúncias já estavam na corregedoria e soube que Francisco deu os encaminhamentos na apuração. Isto pode ter criado uma pressão para que ele saísse, é claro”, disse Geraldo. Ele próprio ainda conta que só não foi exonerado pela condição de seu cargo.

“O ouvidor tem mandato, escolhido por eleição e é de certa forma protegido, senão eu também teria sido exonerado. Só saí porque meu mandato acabou. E o fato de um corregedor ser exonerado por fazer seu trabalho não é novidade. Temos pelo menos dois casos recentes”, conta ele. Os casos citados por Geraldo Wanderley são os de Oswaldo Monte Filho, exonerado em dezembro de 2005 e que saiu afirmando que existia um “corporativismo doentio” dentro de setores da segurança pública, e de sua substituta, a advogada Ana Maria de Arruda, exonerada em junho de 2006 junto com outros oficiais da PM que ocupavam cargos na corregedoria por “descumprir ordens” do então secretário de segurança Glauberto Bezerra durante uma greve de policiais.

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