A gente hoje já superou os 2 gigawatts de produção em 77 parques eólicos. É o primeiro Estado brasileiro a romper essa barreira. Mas já estamos além disso. É mais que a produção da América Latina inteira. No total, temos 2,5 giga de produção de energias renováveis.
Desse total, quanto se consome no Estado ?
Para suprir a demanda energética do Estado, se necessitaria hoje de cerca de 700 megawatts de capacidade instalada. Nós já estamos folgadamente exportando energia. Os parques eólicos só trabalham 50% do tempo. Mesmo assim, você teria um 1 giga de folga. A capacidade instalada não é necessariamente o que você produz. Às vezes você tem oscilações.
Essa energia é exportada de fato. Existem condições para isso?
Sim, existe. Esses dois 2 gigawatts estão operando. Aquele processo todo que se faltava linha de transmissão já está superado. As linhas estão funcionando e os parques estão conectados. O que temos agora é a construção de novas linhas de transmissão para outros parques eólicos de leilões mais recentes. Hoje toda essa energia que falei está gerando e sendo exportada.
Quais estados recebem essa energia?
Esse é um sistema nacional interligado. É muito difícil você dizer, mas o natural é que vá para os Estados mais próximos. Então você tem Paulo Afonso na Bahia, exportando para o Nordeste. Tucuruí, que manda um pouco de energia via Maranhão e Piauí, e agora Rio Grande do Norte e Ceará despachando energia eólica na mão inversa.
Se o Rio Grande do Norte produz mais energia do que necessita, porque na tarifa de energia elétrica é cobrada a bandeira vermelha?
As tarifas de energia elétrica não são regionalizadas nem estadualizadas. Se você fizesse isso seria duas vezes equivocado: estaria infringindo o princípio constitucional da igualdade desse tipo de matriz. Você não pode ter um combustível muito mais caro no Acre do que no Rio de Janeiro, se acentuaria as desigualdades regionais. Não é porque você produz a eólica que você vai ter seu próprio sistema de energia e fechar em si mesmo. O país é grande e é uma federação. Na verdade, caso não houvesse as eólicas e não tivesse havido os leilões reversos, que forçam os preços irem para baixo, você teria uma situação muito pior que a bandeira vermelha. A realidade do sistema hidráulico nacional é muito ruim e depende das intempéries. Mais de 70% do país depende de hidrelétricas. A nossa eólica faz diferença, mas ainda não a ponto de arrefecer a dependência da hidrelétrica.
O Rio Grande do Norte tem potencial para expandir ainda mais a matriz eólica?
Uma das propostas que estamos convergindo com o governo do Estado é do tal pré-zoneamento das áreas. De fato, o Rio Grande do Norte tem o potencial de 8 ou dez vezes mais do que os megawatts que a gente tem hoje para ser desenvolvido nos próximos 20 anos. Ninguém aqui é inescrupuloso a ponto de dizer que vamos colocar um aerogerador em cada esquina. Há limitações de caráter paisagístico, logístico, de preservação de áreas para turismo e gestão ambiental. Queremos tratar esse pré-zoneamento com o governo. A única coisa desagradável desse processo é quando você permite a coisa e depois puxa o tapete. A primeira coisa que a gente quer garantir é segurança jurídica para os projetos que já estão instalados, operando. Em relação ao novos e futuros, o pré-zoneamento é bem-vindo para que a gente saiba o que pode e o que não pode.
Por que a energia eólica se desenvolver mais que a solar aqui no Rio Grande do Norte?
O motivo principal é que a tecnologia para eólica em grande escala se desenvolveu mais rápido. Na solar, você tem que colocar muitos painéis para produzir que um aerogerador faz. Há um outro capítulo que é a microgeração, esse sim que a solar ganha de todo mundo. É na sua casa, na sua fazenda, no seu negócio, no seu edifício. Quando você compara a tarifa da energia que chega a minha casa versus tarifa solar num sistema próprio, aí compensa. Mas quando você leva a solar para um leilão para competir com a geração de eólica, biomassa, hidrelétricas de pequeno porte nem com gás, ela perde.
A crise teve impacto sobre o setor eólico no Rio Grande do Norte?
Teve um impacto positivo. O fato de a gente ter entrada 2 gigawatts aqui, algo próximo disso na Bahia, Piauí e Ceará fez com que o Nordeste que era uma região altamente demandante de energia, com um crescimento regional mais acelerado que o Brasil, saísse daquela posição de desafio: “poxa, não posso crescer porque não tenho energia”. E passou a ajudar o sistema nacional através de energia eólica e da solar também futuramente.
Mas especificamente este ano, o crescimento do setor foi comprometido ou se tem uma projeção disso?
Até agora não. A gente vai ter um termômetro correto disso agora em julho quando o governo federal fizer o leilão A – 5 que vai envolver todas as fontes energéticas. Mas aparentemente não houve comprometimento, porque o Rio Grande do Norte é o primeiro lugar em projetos habilitados (candidatos) e o Nordeste é a maioria, na sua maior parte projetos eólicos e solares. Apesar da intempérie da seca, do problema tarifário e de uma situação circunstancialmente mais delicada, se tem um ambiente de investimentos com regras claras e bem proveitoso.
Recentemente foi sugerida a aplicação do sistema de royalties para o setor eólico. Qual o posicionamento do senhor sobre isso?
Colocar royalties sobre o vento vai de encontro de dois princípios básico dos royalties: um é que royalty é sempre sobre receita bruta. Portanto, seria um imposto altamente regressivo ao investimento de eólica que se viabilizou há pouco mais de cinco anos. Qualquer coisa sobre receita bruta não leva em conta a lucratividade do projeto. O royalty se aplica a recursos naturais não renováveis, porque ele é uma compensação econômica para as gerações futuras, já que elas não verão mais o recurso natural que está sendo usado. Então, não se aplica ao caso do vento. Mas as empresas de energia do Estado estão abertas ao diálogo da tributação. Existe uma discussão na tributação do ICMS da energia com o fato de não beneficiar o estado originário, e sim o consumidor. Essa inversão só existe para o petróleo e energia, o que ao nosso ver é um contra-senso hoje. Um sujeito que acende a luz em São Paulo está ajudando a arrecadação do seu próprio Estado. É um incentivo ao consumo. O Estado originário contribui com suas pessoas, com seu meio ambiente para a geração daquela energia e acaba não acontecendo nada.
O senhor está elaborando projeto de lei em parceria com a senadora Fátima Bezerra sobre essa questão. Como está o andamento dele ?
O projeto de lei que estamos propondo ao mandato de Fátima Bezerra, dentro da minha atuação como suplente, é no sentido de dividir meio a meio o ICMS. Na verdade, isso compensaria o royalty. A gente já deu entrada no projeto na consultoria do Senado, que faz a análise da pertinência da lei. A gente fez uma ementa e uma justificativa. O próximo passo é a consultoria devolver com um parecer se faz sentido. Pode ser uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) ou um Projeto de Lei (PL).
O governo Federal tem a intenção de modificar as regras do ICMS para acabar com a “guerra fiscal” entre os Estados. Isso pode deixar esse projeto um pouco de lado?
Pelo contrário. Acho que ele até ajudaria nessa discussão. Tem alguns estados que nem passavam perto de serem produtores de energia, hoje estarão do outro lado da balança, como Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte.
Quanto o setor eólico investe anualmente no Rio Grande do Norte?
Não fazemos esse cálculo anual. De 2008 pra cá, 10 bilhões foram investidos nos parques eólicos. Os investimentos em eólica deixam pelo menos 1/3 em compras locais no Estado. Sobre as compras locais incidem impostos diretos e indiretos. Dos 10 bilhões que o setor eólico investiu no Rio Grande do Norte em forma de equipamentos, pelos menos, 3,3 bilhões foram injetados na nossa economia.
Recentemente foi criado o Sindicato das Empresas do Setor Energético do Rio Grande do Norte. Qual a diferença entre o Centro de Estratégia, Recursos Naturais e Energia (Cerne) e o Sindicato?
O Cerne, que se configurou no formato “think tank”, um centro de estratégia, quando houve a extinção da Secretaria de Energia em abril de 2010. O objetivo é discutir analisar e ajudar a implementar estratégias de governo e estratégias privadas, ou os dois juntos, para manter conquistas no entorno desses setores. Ele tem um foco no Nordeste setentrional. O sindicato é para representar os interesses das empresas de energia que atuam no Rio Grande do Norte. Como não havia uma escala de empreendedores nisso, não havia sequer um consenso de se criar um sindicato. São mais de 30 grupos atuando por meio de suas subsidiárias.