Notícia publicada na Tribuna do Norte:
Nadjara Martins
Repórter
Três horas e meia separam Marilda Nascimento da Silva, 41 anos, do local de trabalho. Doméstica desde criança, quando começou a trabalhar em “casa de família” na capital potiguar, ela inicia a rotina antes do dia amanhecido: pega o primeiro carro às 4h40 para vencer a distância entre o povoado de Capela e a estação de trem de Ceará-Mirim. De lá, são mais 38,5km até a estação da Ribeira. Logo depois, R$2,35 pagos em passagem de ônibus até Cidade Satélite. Vence outros 15 minutos a pé até o bairro San Vale onde, enfim, Marilda começa a trabalhar.
A doméstica é apenas uma entre os 7 mil passageiros que se espremem, diariamente, nas du-as locomotivas que fazem o percurso entre Ceará-Mirim, Natal e Parnamirim. No total, 24 viagens realizadas diariamente entre os três municípios, com intervalos que chegam a até 2h30. Mas ainda há, entre os passageiros do sistema ferroviário da capital, uma expectativa de mudança: a implantação do primeiro vagão do Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT), prometido pela Superintendência de Trens Urbanos de Natal (CBTU). O VLT vai operar a linha entre Parnamirim e Nordelândia, na Zona Norte da cidade. A expectativa é de uma viagem realizada a cada 20 minutos.
Marilda faz o caminho Capela-Natal há 27 anos, no primeiro vagão do trem. Conhece os maquinistas pelo nome, fez amigos no percurso. Combinam, uma vez por semana, um lanche coletivo na viagem – o divertimento ajuda a compensar as quase 7h diárias gastas dentro dos transportes.
Sete mil passageiros utilizam, diariamente, as duas locomotivas que fazem o percurso entre Ceará-Mirim, Natal e Parnamirim – Foto:Adriano Abreu
“É cansativo, mas é a única solução. Divertimento mesmo só dentro do trem, com as colegas. Eu tenho muita vontade de arranjar um trabalho por aqui, porque sairia mais tarde, com o dia já amanhecido. Venho aqui praticamente só para dormir. Dá para ir levando porque a gente se acostuma”, confessa Marilda. Para a doméstica, a correria de tempo é compensada pelos gastos do mês. “Se eu for e voltar de ônibus, gasto por dia R$ 16,70. Muito pesado. De trem, dá pouco mais de R$ 6”, acrescenta.
Enquanto o ar-condicionado e a velocidade do VLT não chegam, os passageiros continuam com a diária de atrasos e locomotivas quebradas. Há relatos, entre os passageiros, de apedrejamentos do trem ao atravessar comunidades próximas ao Rio Potengi; além do uso de guarda-chuvas dentro do trem por causa das janelas quebradas. Atualmente, apenas duas locomotivas da década de 1950 pertencem à companhia. Outras duas, adquiridas recentemente, estão em testes. Os vagões, com janelas quebradas e bancos de plástico, ainda não têm data para ser trocados. Os 12 VLTs adquiridos pela CBTU só devem estar testados e em pleno funcionamento nos próximos três anos.
Na volta do trabalho, a correria de Marilda é maior: se algum engarrafamento acontece ou ônibus quebra, cresce o receio de perder o trem. “Às vezes quando a gente sai já vai olhando a hora, né? Porque se tiver engarrafamento, se atrasar, fica com medo de perder”, diz a doméstica, que prefere subir a pé para outro bairro em busca de ônibus. Mesmo com os percalços, Marilda gosta do trem. “De ônibus a gente já anda com medo, no trem não.” Apita a buzina, são 5h15. Hora de sair.
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