Tradição da pesca artesanal enfrenta declínio no RN

20 de janeiro de 2014

Notícia publicada na Tribuna do Norte:

Os despertadores ainda não tocaram quando eles já deram os primeiros passos rumo ao trabalho. A maresia e os longos anos em atividade se apresentam em suas roupas desgastadas, mãos calejadas e ombros cansados. Os trabalhadores da fonte econômica mais antiga de Natal amanhecem na desesperança e rumam ao declínio da tradição da pescaria artesanal.

Pesca artesanal vive declínio no RN

Nas praias da Redinha e Ponta Negra, em Natal, e Pirangi do Sul, em Nísia Floresta, a atividade é a principal fonte de renda da maioria das família, mas a pesca está sentenciada ao fim, segundo os próprios pescadores. Além da idade avançada, a maioria sofre com doenças adquiridas na atividade e rumam à aposentadoria. Já seus filhos,  não querem mais seguir a tradição da família. Dados da Colônia de Pescadores de Natal apontam em 2001 havia 1.500 associados. Hoje são apenas 800, quase a metade.

Em Ponta Negra, os pescadores quase perderam espaço para o enrocamento. Na Redinha, diminuiu o número de pescadores e houve queda na produção, o que fez aumentar o preço do pescado. (Foto: Vlademir Alexandre)

Em Ponta Negra, os pescadores quase perderam espaço para o enrocamento. Na Redinha, diminuiu o número de pescadores e houve queda na produção, o que fez aumentar o preço do pescado. (Foto: Vlademir Alexandre)

“Os meninos iam nascendo e o pai já levava pra pescaria, ensinava a pescar. Hoje não fazem isso, vão estudar. Não querem porque dizem que a mão dói. Eu já disse lá em casa para meus meninos. ‘Rapaz, eu com minhas mãos doendo (tenho três filhos homens), eu criei vocês puxando aquilo’”, conta Manoel dos Santos da Silva, conhecido como Santino, 74, que desde os 15 anos é envolvido na pescaria. Mesmo aposentado, todos os dias ele vai à praia buscar a “mistura” da refeição, mas apenas com a rede de tarrafo, pois sua hérnia de disco, localizada na virilha, não o permite o esforço numa rede três mários, a utilizada na pesca com técnica de arrasto.

Luiz Gonzaga Ferreira, 59, está próximo da aposentadoria, pois pelo INSS, é instituído 60 anos de idade. Apesar dos mais de trinta anos na ativa, ele não indica a profissão. “Sou filho de pescador, pesco, mas meu filho não queria que fosse. Porque é um negócio sem futuro”, relata decidido. “Não tem esperança para o pescador, pescador é uma classe sofrida. Não tem melhora para ele não. Ou fica aleijado, ou cego”, relata.

Assim como diminuiu o número de pescadores, também houve queda na produção de peixe, o que tem valorizado o produto. Eles dizem que hoje ganham mais. Um ponto positivo, dentre os males.  “Hoje se ganha mais.  No tempo anterior tinha mais peixe. Hoje tem menos, mas ganha mais. A valorização foi crescendo, o peixe tem mais valor”, lembra Santino. Ele conta que anos atrás pescou 512 charéis. Na época, vendeu todos por  R$ 300 reais. “Já vi vender hoje um charéu só por 80 reais. Pense aí se fosse hoje” (sic). Outro fator positivo é que com o crescimento do turismo, o peixe ginga é bem procurado pelos atravessadores – pessoas que revendem  no mercado -, e pelos comerciantes das praias.

Pirangi do Norte: a cada ano diminui o número de pescadores. Quem continua na atividade afirma que “é uma vida muito sofrida”. (Foto: Vlademir Alexandre)

Pirangi do Norte: a cada ano diminui o número de pescadores. Quem continua na atividade afirma que “é uma vida muito sofrida”. (Foto: Vlademir Alexandre)

Somado às próprias condições do trabalho, a falta de incentivo por parte do poder público também é uma das reclamações. “Nunca vi momento mais difícil”, frisa Rosangela Silva, presidente da Colônia de Pescadores, instituição representante da classe. Apesar da facilitação do governo federal de financiamento junto aos bancos, muitos não conseguem ultrapassar as barreiras burocráticas, afirma. Alguns conseguiram comprar motores para suas jangadas ou barcos, mas as embarcações continuam obsoletas.

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Menos pescadores, mais marinheiros

Notícia publicada na Tribuna do Norte:

Nos mares de Pirangi do Norte, em Nísia Floresta, a tendência profissional é diferenciada das demais praias urbanas. Muitos pescadores, habilitados a conduzir barco a motor pela carteira POP – de pescador profissional -, estão migrando para a atividade turística. Alguns nos três meses de verão (janeiro, fevereiro e março), outros o ano inteiro. Eles são contratados para pilotar lanchas particulares ou de empresas de passeio. Enquanto a marina de Pirangi do Sul comporta 17 barcos a motor, usados pelos pescadores, o número de lanchas chega a 150.

Eraldo Dantas, 40, filho de pescador preferiu não seguir os passos de seu pai e avô, mas continuou no ambiente marítimo.  Ele é piloto de lancha e guia de turismo e já trabalha na área há mais de 8 anos. Antes, havia sido segurança residencial. Seu pai também deixou a pesca e hoje é dono de uma das empresas locadas na praia.

Eraldo é filho de pescador, mas optou por ser piloto de lancha. (Foto: Vlademir Alexandre)

Eraldo é filho de pescador, mas optou por ser piloto de lancha. (Foto: Vlademir Alexandre)

Questionado sobre porque não quis seguir os passos paternos, a resposta é direta. “É uma vida muito sofrida, via o sofrimento do meu pai e ele também nunca quis que eu seguisse”, revela. “Essa época agora o marinheiro ganha dinheiro”, acrescenta.

Como vantagem, ele também pontua o fato de a pescaria ser sazonal. Dependente da maré, do que o mar oferecer ou até dos períodos de defeso. “Vivemos numa escassez da lagosta nos últimos dez anos. Muitos, como meu pai, venderam seus bens porque não tinham mais como se manter”, afirma.

A queda da produção da lagosta é em todo o Estado, o que tem gerado queda nas exportações, que concentra 90% do produto. De janeiro à novembro de 2013, período em que a lagosta pode ser comercializada, foram exportados 138,981 toneladas e cerca de R$ 4,370 milhões em receita foi gerada para o RN, o que representa menos da metade do volume exportado em 2008: 380 toneladas.  Nos anos seguintes, a quantidade de toneladas exportadas caiu consideravelmente, chegando a 129 toneladas em 2010. Em 2012, foram exportadas 111 mil quilos de lagosta.

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Encurralados pelo desenvolvimento

Notícia publicada na Tribuna do Norte:

Com 60 anos de mar e pesca, e 70 anos de vida, Samuel Rodrigues esperava findar seus dias realizado em sua profissão. “O que eu aprendi foi a pescar. Nasci fazendo pesca e queria terminar a vida pescando. Mas estão tirando isso de nós, não nos resta muito”, lamenta cabisbaixo o pescador, morador da Vila de Ponta Negra, reclamando da obra de enrocamento que ameaçava avançar sobre o local de estacionamento de jangadas.

Em dezembro de 2013, os pescadores foram supreendidos com o avanço da instalação de pedras de grande dimensão sob o local utilizado para o estacionamento de jangadas. Pelos planos da Secretaria Municipal de Obras Públicas e Infraestrutura (Semopi), seria tomada a área de 60 metros além do final do calçadão, próximo ao Morro do Careca. Vinte metros já haviam sido feitos quando, com apoio do Ministério Público, os pescadores reivindicaram seu espaço.

Em acordo entre as partes, serão retiradas as pedras até o último coqueiro do calçadão, liberado o espaço e construído uma rampa para trânsito tanto das jangadas, quantos os carros de serviço público, como Samu, Corpo de Bombeiros e segurança pública.

Na Redinha, o encurralar não é diferente. Os pescadores se sentem prejudicados após a construção da Ponte Newton Navarro, inaugurada em 2007. Segundo Manoel dos Santos, no entorno das bases da ponte, onde ainda há o banho, é impossível para a pesca. Mais um fator para a diminuição na produção.

Pesca artesanal

80 colônias de pescadores em todo RN

à 400 embarcações autorizadas pelo Ibama

à 20 mil é o número de pescadores segundo Ministério da Pesca

à Embarcações:
Jangadas: catraia e piquete (que usa vela), canoa, barco a motor
Redinha: 40 jangadas
Ponta Negra: 40 jangadas
Pirangi do Sul: 17 são barcos a motor, 8 canoas e 2 jangadas

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