Notícia publicada no caderno de Economia da Tribuna do Norte:
Um ajuste de mercado. Após a invasão de grandes construtoras e lançamentos em ritmo recorde nos últimos quatro anos, o mercado imobiliário no Rio Grande do Norte pisa no freio, estanca em lançamentos e tenta viabilizar as unidades em estoque. O setor viveu um período de euforia, entre 2008 e 2010 – quando várias construtoras migraram para o Nordeste – o que provocou a alta dos preços e despejou em média 7 mil unidades ao ano, no mercado. Em 2012, o ritmo é outro, com cerca de 2,3 mil unidades lançadas e uma corrida em busca do consumidor.
Especialistas do setor observam que a hora é de realinhamento, com a saída de algumas empresas do mercado e a reavaliação de investimentos e estratégias por outras. Contudo, não se registra uma queda no volume negociado. Em 2012, o Valor Global de Vendas (VGV) médio no Estado se assemelha com o desempenho de 2010, de cerca de R$ 1 bilhão negociados – apesar da queda no número de novos empreendimentos este ano. Os dados são de um estudo de mercado realizado pela Cyrella Plano e Plano.
A baixa velocidade na execução de empreendimentos espalhados pela cidade e mesmo a quantidade de terrenos marcados que permanecem ociosos – à espera do início de obras – após lançamentos, não são considerados pelo setor como indicativos de desaquecimento de mercado.
“O que ocorre é um sazonalidade, mas o mercado continua crescendo, só que de forma mais lenta”, afirma o presidente do Sinduscon, Arnaldo Gaspar Júnior. Apesar do setor da construção civil continuar puxando a taxa de crescimento do país, lembra ele, para este ano a estimativa é de um crescimento até 2%, enquanto em 2010, chegou a 8%.
O Rio Grande do Norte é um dos estados nordestinos que mais atraiu grandes construtoras que migraram das regiões Sul e Sudeste, expandindo com a capitalização vivida em 2008. Neste período, oito incorporadoras entraram no mercado, entre elas a Cyrella Plano & Plano, a Diagonal e Rossi e a MRV e a Gafisa. Esta última desistiu do empreendimento, cancelou contrato, devolveu o terreno e voltou os investimentos para o Sul, no ano passado.
A tendência, segundo o diretor de Comunicação e Marketing do Sinduscon/RN e diretor da Tecnart Engenharia,Carlos Luís Cavalcanti, é que outras tomem o mesmo rumo “caso não consigam viabilizar os estoques”.
Oferta e preços foram catapultados
A vinda das grandes construtoras para o Rio Grande do Norte e a mudança no modelo de empreendimentos (de pequenos e médios para o conceito de condomínio clube) levaram a um “excesso de estoque e preço alto”, na análise do gerente da MMK Imobiliária, Antônio Baía. A migração de construturas seria a causa da super oferta. Os custos mais altos para se fixarem, por estarem distantes das cidades-bases, puxou o preço alto e um ‘apagão’ de mão de obra vivido pelo setor, no mesmo período. Para Antônio Baía, houve uma supervalorização do preço de terrenos com a chegada das construtoras nacionais, com grandes compras para ‘reserva de terra’, cujos custos foram repassados ao consumidor.
“A dificuldade em viabilizar os estoques não é por falta de consumidor, pois é real a carência habitacional no Estado, mas porque o valor do metro quadrado está fora do poder aquisitivo do potiguar”, frisa Baía. O preço do metro quadrado, segundo o gerente da MMK Imobiliária, cresceu cerca de 60% em quatro anos, sem que fosse acompanhado pelo salário do brasileiro. O setor atua sem um planejamento a longo prazo o que poderá levar a um novo “estouro” de preços, a partir de 2015.
A dificuldade em viabilizar os imóveis prontos em relação à compra na planta, segundo o diretor da Abreu Imóveis e representante da Associação Brasileira do Mercado Imobiliário (ABMI) em Natal, Ricardo Abreu, é a quantidade de parcelas e o valor de entrada mais alto. “Demanda um financiamento mais alto do que quando se tem 36 meses na construção”, disse.
A morosidade causada pela burocracia e a falta de pessoal nas instituições bancárias que atuam junto a concessão do crédito também contribui para que a execução das vendas siga em marcha lenta, dizem os analistas. A morosidade empurra as empresas a estender os prazos de conclusão e entrega dos imóveis, explica o presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci) Waldemir Bezerra. A análise de projetos até a assinatura de contratos pode levar até dois anos.
“Os bancos não estão estruturados para receber essa demanda reprimida e ainda mantém, apesar da queda dos juros e prazos estendidos, uma grande restrição para acesso ao crédito”, afirma Bezerra.
O custo para produzir e a demora em consumar as vendas são consideradas pelo presidente do Creci um “desestímulo” à produção e à permanência das empresas nacionais no Rio Grande do Norte. “O investidor não vai colocar dinheiro para um resultado pequeno ou moroso, é preciso desburocratizar”, afirma.
Bate-papo – Carlos Luís Cavalcanti – diretor do Sinduscon/RN
Qual a avaliação do setor, com o recuo de lançamentos e saída de construtoras nacionais, há dificuldades em viabilizar projetos?
É um movimento natural. Houve um momento de ápice, com grande abertura de capital na Bolsa de valores, o que fez essas empresas nacionais expandirem, buscarem novos mercados no interior de São Paulo, do Rio de Janeiro e também nas capitais nordestinas. Essas empresas chegaram forte aqui, sobretudo nas regiões de Nova Parnamirim e Petropólis, abrindo o mercado para um novo conceito, que é o do condomínio clube. O que ocorre agora é a auto-regulação, com a liquidação dos estoques do que foi lançado anteriormente em grande quantidade. O que se mostra interessante para o consumidor, como uma entressafra onde ocorre queda de preços e facilidades nas condições de pagamento. Mas esse é um movimento transitório.
O que esperar a partir daí?
A tendência é que as construtoras nacionais, que não têm interesse em empreendimentos de pequeno porte comecem a recuar, caso não consigam viabilizar os estoques. Porque se você trabalha com grande porte, não vai correr o risco de lançar 500 unidades e chegar ao final sem ter conseguido 300. É uma questão de adequação. É preciso lembrar que o mercado potiguar tem demanda com renda e necessidade de adquirir moradia.
E qual a dificuldade em liquidar estoque?
O consumidor está mais cauteloso, prefere analisar mais, esperar melhores condições, usa o poder de barganha. Há muitas promoções em curso tentando fisgar esse consumidor.
Há rumores de que terrenos adquiridos pelas construtoras estariam sendo devolvidos. Isso mostra uma dificuldade financeira?
Não dá para generalizar. Há casos de negociações de área em que as empresas não têm o mesmo interesse e pode chegar a devolver. Mas há também casos de empreendimentos aprovados que não tem como ser executados hoje, devido a essa questão de finalizar estoque, reavaliar a situação. A viabilidade depende de localização, oferta, apelo. Algumas sequer devem lançar em 2013, mas não é regra geral.
Qual a expectativa para 2013?
Estamos com otimismo, como todo brasileiro. Esperamos um bom volume de vendas e a retomada de lançamentos, visto que as condições do país são favoráveis e o mercado potiguar tem demanda com renda e necessidade de adquirir moradia.
Ano foi de atenção, diz empresa
O ano de 2012 foi de “atenção e adequação”, mas não de perdas para o setor. A avaliação é da gerente geral da Cyrela Plano & Plano, Renée Silveira, que assegura: mesmo com a redução no número de lançamentos em relação aos anos anteriores, o valor geral de vendas se manteve estável. A manutenção se deve a mudança de público, que passou de empreendimentos voltados para a classe média baixa – com as construções do programa Minha Casa e Minha Vida – e hoje estão focadas nas classes de rendas mais altas.
Um estudo de mercado realizado pela construtora mostra o movimento de unidades lançadas a partir da chegada dos chamados ‘players’ (veja box). Todas as construtoras juntas colocaram na região da Grande Natal no mercado (contabilizando somente empreendimentos verticais), em média 9 mil unidades em 2010. Em 2011, 4,1 mil unidades lançadas e este ano não ultrapassou as 2,3 mil moradias.
Contudo, analisa Renée Silveira, o Valor Geral de Vendas (VGV – índice que mede o valor global comercializado) em 2012 é de R$ 1 bilhão. “O valor se assemelha ao executado em 2010 e 2011, que ficou em R$ 1,3 bilhão, ao ano”, disse a executiva. Isto se deve a variação no ticket médio de produtos lançados (valor médio por unidade). Segundo o estudo, o ticket médio de produtos hoje é de R$ 300 mil a R$ 450 mil. Em 2009 e 2010, o valor era de R$ 150 mil. “Não houve um crescimento de público, de fato, mas mudança de perfil”, afirma.
Nos primeiros anos, houve muitos lançamentos para atender um público que precisava de financiamentos bancários, com valores médios mais baixos, para o programa habitacional MCMV. “Agora quase ninguém lança MCMV. É uma adequação à demanda existente”, analisa a gerente geral da Cyrela.
Com um estoque de 25% do que foi lançado, a construtora nega que exista dificuldade financeira em viabilizar projetos e garante que não há pretensão de deixar o mercado potiguar. Rumores do setor indicavam a desistência de terrenos já negociados, a não execução da segunda fase do empreendimento Vita e o cancelamento de novos lançamentos – o que foi descartado pela executiva. “Não há dificuldades em viabilizar projetos”, disse Renée Silveira. “Este ano, só abrimos a segunda fase do Quartier, em Lagoa Nova. Mas temos seis terrenos comprados e mais de duas mil unidades aprovadas a serem lançadas”, acrescentou.
Para ela não há desaceleração, mas uma acomodação devido a dinâmica do mercado executada a longo prazo, diferente do que ocorre no varejo. Uma construtora leva no mínimo quatro anos desde a concepção e chegada no mercado até o lançamento, construção e entrega do produto. “Estamos com todos os cronogramas em dia”, pontua.
Para 2013, estão previstos e aprovados o lançamento de dois novos empreendimentos da Cyrela Plano & Plano, cujas datas dependem somente de definição de metas e preços, que deve ocorrer até fevereiro. Além da entrega de outros três empreendimentos, entre eles o Vita. Com a diversificação de produtos em segmentos que atendem desde o MCMV até de alto padrão, o problema não seria preço preço do metro quadrado, mais alto que o poder de compra, segundo ela. “O INCC (Índice Nacional de Custo da Construção) não varia muito aqui e no Sul, é o mesmo em Natal e para São Paulo”.
A Gafisa, que saiu do mercado potiguar em 2011, foi procurada pela TRIBUNA DO NORTE, mas informou não ter porta-voz para entrevista esta semana. Em junho de 2011, em matéria da TN, a Gafisa justificou a saída afirmando que por questões de viabilidade econômica, suspendeu a incorporação do empreendimento realizado em parceria com a Planc Engenharia e Incorporação Ltda., em Natal. E deixou em aberto a possibilidade de retorno ao mercado potiguar.
Mercado do RN ainda tem ‘sobras’ de 2010
Passado o “boom” imobiliário, o Rio Grande do Norte, segundo o diretor da Abreu Imóveis e representante da ABMI, Ricardo Abreu, se transformou em “praça de estoque”. Cerca de 15% do que foi lançado no mercado em 2010 ainda não foi vendido.
O foco das construtoras está voltado para a finalização desses estoques. “Houve uma corrida de empresas nacionais para cá, o que melhora a qualidade da concorrência, aumenta a competitividade e quem ganha é o mercado, o consumidor”, avalia Abreu. Hoje em Natal, acrescenta ele, há maior diversificação de produtos, tipologias e marcas. A acomodação do setor, segundo Jailson Dantas, presidente do Sindicato das imobiliárias (Secovi/RN), é um processo natural na dinâmica do mercado. “Houve um investimento em grande escala e agora as construtoras estão reavaliando os números, a velocidade de vendas, mas não há desaquecimento”, disse.
Na avaliação de Sílvio Bezerra, ex-presidente do Sinduscon/RN e presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae, faltou planejamento para as empresas que se instalaram e desistiram do mercado potiguar. “Houve dificuldade em relação aos custos de produção, em não conseguir mão de obra qualificada, somado a um pessimismo frente a economia mundial que causou uma espera, um receio no consumidor”, explica.Devido aos elevados preços de terrenos adquiridos, instalação em solo potiguar e troca de tecnologia para formação de pessoal e acesso a material, explica Sílvio,o preço do metro quadrado praticado pelas grandes ficou superior ao comercializado pelas empresas locais, que atuam em segmentos menores. Enquanto no primeiro caso pode chegar a R$ 8 mil, o metro quadrado, as menores trabalham com faixas entre R$ 3,8 mil a R$ 4,5 mil. O preço do metro quadrado, entretanto, sofre influência de outros fatores como a localização, quantidade de quartos, tamanho da unidade e acabamentos usados.
Momento da construção é favorável ao consumidor
Se por um lado a quantidade de imóveis prontos à vendas pode acender um alerta para ajustes no setor, por outro mostra um cenário propício para o consumidor. Para viabilizar o estoque as construtoras se valem de uma série de promoções, com prêmios, como cozinhas, viagens e descontos, além, de participação em feirões imobiliários. A Diagonal e Rossi, neste fim de semana, oferece abatimento de mais de R$ 100 mil no valor final do imóvel. A empresa informou não dispor de porta-voz e nem poder atender aos questionamentos encaminhados.
A “queima de estoque” de imoveis pode causar um efeito colateral, segundo o presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil, Arnaldo Gaspar. “Pode gerar um expectativa de queda ainda maior, ao longo do tempo, fazendo com que o consumidor fique mais retraído, à espera”, avalia.
A estratégia adotada por muitas empresas para finalizar cerca de 15% do que foi lançado, é de ofertas agressivas na disputa pelo consumidor. “É o melhor momento para o consumidor, que tem, sabe e se vale do maior poder de barganha. O consumidor está mais cauteloso e maduro para fazer as escolhas”, lembra Jailson Dantas, presidente do Secovi.
Mas não se engane, essas estratégias são consideradas pontuais. “Somente quem tem grande estoque está adotando, não deve haver uma queda de preço em massa. A tendência e estabilizar”, adverte Dantas.
Com a manutenção da taxa Selic, em 7,25% ao ano, aprovada pelo Copom esta semana, o ex-presidente do Sinduscon Silvio Bezerra, espera a estabilização dos preços. “O momento é ideal para a compra, nunca os juros foram tão baixos, há maiores prazos para financiamento e larga oferta de produtos”, disse.
Para 2013, analistas e representantes do mercado esperam uma retomada modesta nos lançamentos. “Só ocorreria desaceleração se tivéssemos retorno da inflação, desemprego em massa. A tendência é de estabilização em 2013”, observa Waldemir Bezerra do Creci.
Para Ricardo Abreu, 2013 será novamente de lançamentos. “As condições da economia nacional favorável e o interesse de instituições bancárias em viabilizar os financiamentos imobiliários se somam ao otimismo do setor.
A permanência das construtoras nacionais que migraram para as capitais do Nordeste, segundo a Associação Brasileira de Mercado Imobiliário dependem da estratégia correta. No Maranhão, em 48 horas um pool de imobiliárias vendeu 390 lotes de um empreendimento da Damha Urbanizadora. O fato mostra a tendência de construtoras do Sul e Sudeste investirem em solo nordestino.
“Há um movimento de novas empresas para o Rio Grande do Norte, pelo menos seis chegando em breve. Isso deve mudar a dinâmica do mercado”, afirma Ricardo Abreu, representante da ABMI.
No Ceará, erros de estratégia levaram a migração que ganhou força no ano de 2007, perder intensidade. Na avaliação do representante da ABMI de Fortaleza (CE), Silvio Oliveira, algumas empresas do Sudeste chegaram com estratégias convencionais e não conseguiram lidar com as particularidades do mercado cearense.
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