Licitação do transporte público em Natal gera polêmica

18 de junho de 2012

O primeiro processo licitatório do transporte público de Natal não tem mais data prevista para ser deflagrado. A última previsão da secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) apontava o dia 20 deste mês como data limite para publicação do edital. Porém, a lei que autoriza o processo ainda precisa ser votada pelos vereadores. O que, segundo a própria Semob, não deve acontecer nos próximos dias. Somente na semana passada, a lei chegou à Câmara Municipal para percorrer o trâmite regimental exigido.

Estão previstas várias mudanças no transporte coletivo na capital potiguar: frota, quantidade de linhas e implantação da integração dos transportes convencional e opcional através da bilhetagem eletrônica única são algumas das modificações esperadas. A tarifa sofrerá reajuste à medida que as novas regras passarem a valer. O tempo de concessão será de 15 a 20 anos.

O transporte público deve passar por uma série de mudanças, mas ainda não há data para implantação. (Foto: Júnior Santos)

O processo licitatório deve passar por três etapas: autorização, regulamentação e operacionalização. A autorização é definida pelos vereadores que aprovam uma lei encaminhada pela Procuradoria Geral do Município (PGM). O envio da lei, de acordo com   secretário-adjunto de Trânsito da Semob, Haroldo Maia, foi feito há algumas semanas, porém, algumas alterações foram feitas e, na semana passada, a PGM encaminhou o projeto de lei substitutivo. “Essas correções foram sugeridas pelos próprios vereadores durante audiências públicas realizadas na Câmara. Enviamos o projeto substitutivo e aguardamos a votação da autorização para publicar o edital. Não há uma previsão de quando isso acontecerá”, explica.

O projeto deve percorrer as comissões de Justiça, Finanças e Transportes. De acordo com o presidente da Comissão de Transportes, Raniere Barbosa, a licitação vai acontecer de forma “errada”. Segundo ele, antes de pensar sobre processo licitatório, seria necessário implantar o Plano Diretor de Mobilidade (PDM) da cidade. O edil explica que o plano foi elaborada na gestão passada mas nunca foi discutido com a sociedade. “O PDM é quem deveria orientar a formulação da licitação.  O processo, nesse momento, está na contramão”, disse.

Caso o PDM seja aprovado, o processo licitatório que está em trâmite poderá sofrer alterações no futuro. “É uma possibilidade que pode acontecer. Algumas regras podem ser revistas. O plano definiria, por exemplo, quantas linhas são necessárias para a cidade, além dos itinerários, paradas de ônibus, entre outros”, afirma Raniere. O Plano Diretor, de acordo com o vereador, é uma exigência do Plano Nacional de Mobilidade aprovado esse ano pela presidenta Dilma Rousseff.

Algumas regras e definições do edital que está em fase de elaboração pela empresa paulista Oficina Consultores Associados S/C Ltda. foram apresentadas pela Semob durante uma audiência pública realizada no final do mês passado [veja info]. O trânsito de Natal será dividido em dois lotes: norte e sul. As empresas que se interessarem em participar da licitação terão que apresentar propostas para cada lote separadamente. Haverá redução no número de ônibus e alternativos. No entanto, segundo Haroldo Maia, secretário-adjunto de Trânsito, a área de cobertura será ampliada. “Teremos um acréscimo de 6%. Isso vai acontecer porque vamos integrar as duas redes existentes: convencional e opcional”, disse.

O transporte alternativo passará por modificações mais perceptíveis. Os micro-ônibus deixarão de circular por bairros como Cidade Alta, Centro, Alecrim, Quintas e Tirol. O número de linhas será maior no lote norte. Com relação às empresas de ônibus, aquelas que ganharem o processo licitatório terão que investir, de imediato, mais de  R$ 150 milhões para aquisição de equipamentos de sistema de bilhetagem, veículos novos e investimentos em tecnologia. As empresas terão que equipar os veículos com câmeras de segurança, sistema de recepção de sinal GPS e, em alguns linhas, sistema de som interno para anúncio de próxima parada.

Projeto não contempla integração

A licitação do transporte coletivo de Natal não contempla a integração de ônibus e alternativos com os trens. Atualmente, metroviários e ferroviários da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) estão em greve há mais de um mês em cinco Estados. Na capital do Rio Grande do Norte, usuários reclamam e aguardam a implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).

Não está prevista integração entre transporte ferroviário e rodoviário. (Foto: mobilize.org.br)

Adquiridas em 1968 pela extinta Rede Federal Ferroviária (RFFSA), as quatro locomotivas que conduzem os vagões da CBTU em Natal, nunca foram trocadas. Já os vagões, são os mesmo desde o ano em que foram comprados, em 1970. Das quatro máquinas, porém, somente duas estão em uso. O que reduz a 50% o fluxo de viagens. A passagem custa R$ 0,50 e o único atrativo para centenas de passageiros que utilizam o transporte.

É o caso do autônomo Jorge Fernandes que mora no bairro Bom Pastor e trabalha no Centro da cidade. Todos os dias, o trabalhador sai de casa às 8h e retorna às 18h40. Com a greve, a volta para casa ficou mais difícil. “Mas é o jeito porque não tenho condições de pagar R$ 4,40 todo o dia com as passagens de ônibus. A economia com o trem é muito grande. Por isso que estou aqui”, relata.

Na última quarta-feira, a TRIBUNA DO NORTE acompanhou o embarque de 255 passageiros no trem que fez a viagem até Ceará-Mirim. Antes do veículo partir, muita reclamação. “Se chover, a gente se molha. O teto está furado. Fora isso, você pode ver, as portas estão quebradas. Algumas não fecham completamente e o risco é grande”, diz o também autônomo Ernande de Araújo.

Os usuários têm esperança de que o transporte melhore com a aproximação da Copa do Mundo 2014 e a possível instalação do VLT. Porém, há entraves para o projeto sair. A CBTU/RN ainda aguarda documentações necessárias da Secretaria Extraordinária para Assuntos Relativos à Copa (Secopa). O Governo do Estado já anunciou que o Governo Federal liberou recursos na ordem de R$ 130 milhões para a obra.

A sigla VLT já é bastante conhecida pelos natalenses. Em maio de 2006, a CBTU apresentou o projeto de troca das locomotivas e vagões por equipamentos mais modernos e leves. O projeto, inicialmente orçado em R$ 162 milhões, nunca saiu do papel. A implantação do programa voltou à pauta de discussões dos gestores estaduais e municipais, com o anúncio de Natal como uma das cidades-sedes da Copa do Mundo de 2014.

Este ano, o projeto passou a ser responsabilidade do Governo do Estado, já que abrange outras cidades da Região Metropolitana, como Extremoz e São José do Mipibu.

Edital de licitação é polêmico

Antes mesmo de sua publicação, o edital da primeira licitação do sistema de transporte público de Natal já causa polêmica. Empresários e usuários discordam de algumas regras, especialmente no que diz respeito ao transporte alternativo. Sob a justificativa de que os alternativos devem apenas fazer a ligação com o transporte convencional, a Semob quer a diminuição de linhas e quantidade de micro-ônibus circulando na cidade. Além disso, os alternativos deixarão de circular em bairros como Cidade Alta, Centro, Alecrim, Quintas e Tirol.

Atualmente, a avenida Deodoro da Fonseca é um dos principais corredores onde os alternativos trafegam. Na última quarta-feira, em uma das paradas existentes na  via, a aposentada Maria do Rosário esperava o micro-ônibus da linha 503. De acordo com a aposentada, o transporte alternativa é mais rápido que o convencional, porém, são poucas as opções, especialmente nos fins de semana. “Onde eu moro só passa um ônibus que demora muito. O alternativo é mais rápido, mas no fim de semana demora mais que o ônibus”, diz.

Maria do Rosário é contra a regra defendida pela Semob que limita o espaço onde os alternativos podem circular. “Isso vai prejudicar a gente. Só pode fazer isso se aumentar o número de ônibus”, coloca. A corretora de consignados Aurineide Galvão pensa da mesma forma. “Pego alternativo todo dia. Moro na zona Norte e o único ônibus que passa é o 81 que demora uma eternidade para passar. Se acabarem com os alternativas, vai ser muito ruim para gente”, pontua.

O Sindicato dos Permissionários de Transporte Opcional de Passageiros do Rio Grande do Norte (Sitoparn) também é contra a proposta. “Não podemos ficar satisfeitos com uma proposta dessa. Quando fomos licitados, há 14 anos, não havia essa previsão de redução. Porque querem fazer isso agora?”, questiona o presidente do Sitoparn, Nivaldo Andrade. Atualmente, existem 24 linhas de opcionais e 117 vagas para permissionários. A  Semob propõe uma mudança para 11 linhas e 80 permissionários.

O Sitoparn prometeu que iria apresentar uma denúncia no Ministério Público Estadual (MPE). No entanto, até semana passada, segundo a assessoria de imprensa do MPE, nenhuma reclamação teria sido entregue ao órgão.

“Natal não tem Plano Diretor de Mobilidade” 

Bate-papo » Raniere Barbosa – vereador

O senhor é presidente da Comissão de Planejamento Urbano, Meio Ambiente, Transportes e Habitação da Câmara Municipal, então esclareça qual o trâmite para aprovação da licitação do transporte coletivo?

O projeto de lei autorizativo tem que ser aprovado pela Câmara e, para tanto, vai passar pelo trâmite regimental. Atualmente, está na Comissão de Justiça, depois vai para Comissão de Finanças e por último na Comissão de Transporte. Depois, as comissões emitem os pareceres e só então vai ao Plenário para votação.

A licitação pode acontecer sem antes discutir o Plano Diretor de Mobilidade (PDM)?

A licitação é necessária, porém, é preciso discutir primeiro o PDM. Natal não tem e é uma das exigências do Plano Nacional de Mobilidade (PNM). Na verdade o PDM está feito, foi entregue na gestão passada, mas nunca foi encaminhado para Câmara, nem foi discutido com a sociedade. A licitação ocorre em três etapas: autorização, regulamentação e operacionalização. A Câmara realizou três audiências públicas sobre o assunto e é favorável à licitação, contanto que tenha transparência e observe essas três etapas.

Qual a importância do PDM nesse processo?

O PDM daria os vetores para a licitação do transporte coletivo. O edital da licitação seria em função do Plano. Agora, do jeito que está, ocorre o contrário. Estão na contramão. Corre-se o risco de que, no futuro, quando o PDM foi aprovado, ter que mudar alguma orientação que não esteja contemplada na licitação.

O senhor acredita que a população tem conhecimento desse processo?

É preciso ampliar a discussão. Sou a favor de que haja um desmembramento na Semob entre secretaria de Trânsito e secretaria de Transporte. Não recebemos os detalhes desse edital. Não podemos falar sem conhecer. Não dá para opinar sem propriedade.

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