Daniel Turíbio

Daniel Turíbio é jornalista da agência Smartpublishing Mídias em Rede. Já trabalhou com mídia impressa, rádio e assessoria de comunicação. Reside em Natal/RN.

Adesão do sócio-torcedor é alternativa para faturamento de clubes

21 de maio de 2012

Demorou um pouco, mas os potiguares acordaram para a realidade de que os programas de sócios-torcedores são a salvação de muitos clubes mundo afora. Em um centro onde a captação de parcerias não chega nem perto da realidade do eixo Rio-São Paulo, por exemplo, o financiamento da torcida parece ser a melhor – senão única – saída para ABC e América competirem em igualdade contra os poderosos da Série B. Pioneiro na questão, a luta do ABC é reativar o bom desempenho de seu programa de sócio, já o América promete, daqui para o final do ano, igual – ou quem sabe passar – o rival.

Para a disputa da Série B, o ABC e América devem receber R$ 2 milhões de cotas de transmissão, o que representa um receita de R$ 250 mil mensais. Essa, segundo os dirigentes, será a maior receita mensal dos clubes, dada a dificuldade na captação de patrocínios. Logo atrás disso vem a receita dos programas de sócios. Do alvinegro, por exemplo, rende atualmente algo em torno de R$ 160 mil por mês, valor que poderia ser ainda maior se não fosse a taxa de quase 50% de inadimplência no quadro de associados do clube.

De mais de 10 mil cadastrados, segundo a diretoria, apenas de 5 mil aproximadamente têm honrado seus pagamentos. O número, segundo os gestores do programa Sócio Mais Querido, é inconstante e varia de acordo com o calendário  e/ou desempenho do time alvinegro em campo. O grande problema, dizem os dirigentes, é que no futebol o clube não pode ficar sujeito aos acasos, já que mensalmente tem que cumprir com suas obrigações financeiras com seus funcionários, jogadores e demais gastos administrativos.

O grande vilão desse programa de sócios abecedista parece ser o pagamento da mensalidade através do boleto bancário. Implantado em junho de 2010, o Sócio Mais Querido viveu seus tempos de glória no i nal daquele ano e início do ano passado, quando depois de campeão da Série C do Campeonato Brasileiro e de volta à Série B, o clube alcançou a marca histórica de 10 mil associados cadastrados.

A empolgação passou, o time perdeu o tricampeonato e agora o torcedor abecedista parece que esqueceu o boleto de seu título de sócio no fundo da gaveta. O número de 5 mil sócios em dia, inclusive, já foi aumentado, já que segundo informações não-oficiais da própria diretoria alvinegra, o ABC já teve pouco mais de 4 mil sócios-torcedores em dia. “O problema se dá muito por conta do boleto. A gente sabe que, não só aqui, mas em todos os clubes do Brasil e até da Europa, o torcedor varia de acordo com o resultado do time em campo”, explica o vice-presidente administrativo alvinegro, Wilson Cardoso.

Para não ficar mais sujeito exclusivamente ao temperamento do torcedor, o ABC parece ter aprendido com o exemplo de outros clubes – inclusive do rival América – e agora quer fazer com que seus associados migrem do pagamento de boleto bancário para o cartão de crédito, onde o clube recebe o valor da anuidade de uma única vez e pode traçar seu planejamento para a temporada desde o início do ano.

“Nós estamos desde o final do ano passado com uma campanha para o torcedor migrar para o pagamento com o cartão de crédito, dando inclusive alguns prêmios, como camisa oficial, para o torcedor que sair do boleto para o pagamento através do cartão”, comenta Wilson Cardoso. O objetivo do clube, segundo os gestores do programa Sócio Mais Querido, é extinguir o pagamento através do boleto bancário.

Boleto é espécie em extinção

Se o ABC aprendeu com a experiência do América, o time rubro também tomou como base a experiência do rival para montar seu plano de sócios, o Sócio Dragão, que esta semana atingiu a marca de 2 mil associados. Para ser sócio do América, não há como optar pelo pagamento em boleto, apenas no cartão de crédito. O resultado, como o clube diz, é que o alvirrubro não tem “sócios cadastrados”, mas sim “sócios de verdade”.

ABC conseguiu chegar aos 10 mil associados, mas inadimplência cortou renda pela metade. (Foto: Argemiro Lima)

A decisão por não disponibilizar o pagamento através de boleto ao torcedor partiu de um estudo de caso feito pelo América e a Premier Group, empresa que administra o programa de sócios do clube. “Essa foi uma decisão que a gente tomou tomando como base a experiência de outros programas. As experiências de outros clubes comprovam que o boleto tem uma inadimplência muito alta, principalmente nos momentos que o clube não tem jogos, como nos finais de temporada e em situação como no ano passado, que o América terminou o Estadual e passou um certo tempo para iniciar a Série C, ou mesmo quando o time está passando por má fase dentro de campo se tem um reflexo direto no pagamento do boleto”, explica

Especialista na área de marketing esportivo, Mark Pinheiro ressalta ainda que o não-pagamento do boleto da mensalidade do sócio não depende apenas da situação do time, mas também pode ser motivado pela situação financeira do próprio torcedor, que “quando tem uma situação de aperto financeiro, começa a eliminar o que se chama de supérfluos e o título de sócio pode ser considerado um dos primeiros desses primeiros supérfluos”.

Sabendo disso, o desejo do América foi fugir da instabilidade. Ao invés de dar mais facilidade na hora de adesão para engordar o quadro de associados, o Alvirrubro preferiu garantir uma receita, mesmo que inferior, por exemplo, à do rival. “No boleto um clube pode ter um dia 4 mil sócios e no outro ter esse número reduzido para 3 mil, então o clube não tem condições de manter um planejamento financeiro estável, já que ele não sabe se pode contar com a aquele dinheiro ou não. É uma grande incógnita”, salienta MarkPinheiro.

Para o presidente do clube, Alex Padang, o América não pode correr o risco de não poder contar com a receita de seu torcedor. “Não adianta você fazer um planejamento para 10 mil pessoas e daqui a pouco só 4 mil apenas pagarem”, diz. Para afirmar isso Padang se espelha no exemplo atual do ABC, que,segundo ele, deveria ter – assim como o América – mais resposta de seu torcedor. “Pelas campanhas que o ABC faz o clube não merece que apenas 4 mil sócios estejam pagando em dia”, comenta.

América quer dobrar até o final no ano

Foram muitas as tentativas desde o ano passado. Uma delas foi a contratação de Júnior Xuxa para a campanha do acesso à Série B, quando a direção anunciou que só traria o jogador caso o clube chegasse aos 2 mil sócios. Agora, depois do título estadual e de volta à Série B, o programa de sócios do América deu uma engrenada e hoje conta com mais associados do que em 2007, quando o time rubro disputava a Série A, chegando enfim aos 2 mil associados.

“Nós estamos fazendo 2 mil agora em um programa que vai fazer ainda um ano de existência e fizemos isso somente com o marketing de rede social, com o marketing do boca a boca, da mala-direta”, comenta Alex Padang. Segundo ele, a campanha do Sócio Dragão sofreu uma desacelerada após a perda do primeiro turno do Campeonato Potiguar, primeiro objetivo do América na temporada.

Campanha do sócio-dragão é prioridade no América. (Foto: Argemiro Lima)

“Fazer marketing em situação adversa é ruim, então a gente esperou um grande momento, que foi a conquista do título estadual. Nós saímos de 1.400 sócios para 2 mil e até o final do ano nossa meta é chegar aos 4 mil”, comenta o presidente americano. Segundo Padang, o principal objetivo da diretoria, que a partir desta semana deve iniciar uma campanha sobre o Sócio Dragão na mídia, a intenção é fazer da torcida a principal parceira do time, também – e principalmente – no planejamento financeiro do clube. “A gente está tentando conscientizar que o sócio-torcedor é co-responsável pela formação da equipe”, diz.

Ao contrário do que cobra a torcida – o resultado em campo para a resposta fora dele – para Mark Pinheiro, diretor da Premier Group, o apoio tem que vir de quem está na arquibancada para o campo de jogo. “É importante o torcedor entender que futebol se faz com dinheiro, não com paixão. No final do mês os jogadores têm que receber e quando não recebem não dão a resposta em campo equivalente. Esse dinheiro só se tem com a colaboração de todos”, afirma.

Como responsável pelo gerenciamento do programa de sócios do América, ele diz que, assim como a diretoria, considera que o fato de jogar em um estádio fora de Natal e com baixa capacidade de público seja um fator complicador, mas que espera uma resposta positiva da torcida em virtude do momento vivido pelo time. “A torcida do América é uma torcida bastante ativa, que está passando por uma momento muito importante (volta à Série B e conquista do Campeonato Potiguar), então as condições em campo são as melhores possíveis”, diz. “Além disso a torcida em uma confiança muito grande na diretoria e principalmente na  figura de Alex Padang, que está continuando esse trabalho na diretoria de uma forma muito bem feita”, comenta.

O objetivo da diretoria neste ano é fazer com que o América tenha uma receita tão importante quanto à  garantida pela participação na Série B na próxima temporada. A conta é simples: com 4 mil sócios, o América terá R$ 2 milhões garantidos em 2013. “Futebol hoje se faz com cotas de televisão e programas de sócio-torcedor e nossa torcida precisa compreender isso. O hoje o América está focado em ser auto-sustentável através do sócio-torcedor”, diz Padang.

Ajuda boa pra cachorro

Mesmo com as dificuldades de logística dos jogos do América – em Goianinha – desde o ano, o torcedor parece que começou a dar a tão esperada resposta da diretoria após o acesso à Série B do Campeonato Brasileiro e a conquista do Campeonato Potiguar 2012, feito que o time rubro não conseguia desde 2003. O Sócio Dragão fechou a semana com a marca de 2 mil associados, segundo a diretoria, entre eles muitos que ainda nem conhecem o estádio Nazarenão e outros que sequer sabem o que é futebol.

É o caso de B-12. Ela é “filha” de Isac e Camila Carvalho Gomes, ambos também sócios do América. O tamanho ainda não permite que ela frequente um estádio de futebol, tampouco a simpática filha do casal demonstra interesse nisso. B-12 não sabe cantar o hino do América, não escuta os jogos do seu time pelo rádio, tampouco é capaz de dizer o nome de pelo menos um jogador do atual elenco rubro. Tudo isso por um detalhe: B-12 é uma cadela.

Sim. Uma cadela. Talvez apenas o animal de estimação a fazer parte de um programa de só-cios de clubes de futebol em todo o país – antes dela o cão Bjorn Borg já havia sido associado ao Internacional por sua dona. Segundo seu dono, a única adesão da cadela não passou de uma brincadeira, mas mesmo sem ter perfis nas principais redes sociais, ele diz que já sabe da repercussão que o fato causou.

“Foi uma coisa que eu fiz para ajudar o América. Eu já era sócio e já havia feito também para minha noiva, que sequer foi lá tirar a foto ainda da carteira, e foi uma maneira que eu achei de contribuir com o clube”, diz Isac Gomes, funcionário do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. “Foi meio que uma brincadeira, mas já que teve essa repercussão toda eu espero que estimule de alguma forma”, comenta. Não só o América ganhou mais um associado com B-12: agora a família é, em sua maioria esmagadora, torcedora do Dragão. De seis, dois são abecedistas e o restante – inclusive a cadela – é americano. Neto de um ex-presidente americano, José Gomes da Costa, Isac agora espera que o restante da torcida aumente a família. “Acho que é única saída para o clube. Realmente a questão do boleto é polêmica, mas é a que dá mais garantia”, diz Isac.

Clubes prometem mais vantagens aos sócios

Ao contrário de outros centros, um entrave para os programas de sócios de ABC e América é a falta de opções para seus associados. Basicamente, o que é oferecido é a entrada no estádio, descontos em produtos oi ciais e em redes de descontos. A parte do clube, como estrutura física, deixa a desejar, comparando-se às realidades de Recife e Fortaleza, por exemplo.

No Recife, Sport, Náutico e Santa Cruz oferecem aos seus associados, além da entrada nos jogos, estrutura de lazer em suas sedes sociais. Na Ilha do Retiro, por exemplo, o Sport dispõe diariamente para os associados o uso de quadras de tênis, futebol soçaite, ginásio e parque aquático com sete piscinas, caso semelhante ao Arruda, estádio do Santa Cruz.

Em Natal uma das reclamações dos sócios é justamente a falta do serviço social. No América, a sede não tem l uxo diário de torcedores no valioso terreno localizado no bairro do Tirol. No ABC, em um dos pontos mais nobres da capital, o torcedor não tem outra opção no Frasqueirão a não ser asssitir aos treinos durante a semana.

A solução encontrada pelos potiguares para ampliar os benefícios aos seus sócios foi a rede de vantagens do associado. No ABC, o torcedor tem direito a descontos em mais de 200 estabelecimentos, segundo o vice-presidente Wilson Cardoso. A diretoria ainda promete o sorteio de uma casa durante a Série B, além do salário mínimo que está sendo sorteado em todos os jogos do Alvinegro. No América, o objetivo é chegar até julho com a garantia de descontos ao torcedor em pelo menos 300 lojas ou serviços, além de outras promoções pontuais que já vem sendo realizadas desde o Campeonato Potiguar.

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