Filhos de pais alcoólatras, os quatro irmãos gêmeos João Antônio e Alice, de 3 anos de idade, e Ítalo e Ícaro, também gêmeos, de dois aninhos, teriam um destino completamente diferente se não fosse a compaixão da tia Margareth Medeiros – aliás, que mais do que uma tia, e se tornou uma verdadeira heroína para essas crianças.
Após denúncia de terem sofrido maus tratos pelos pais – sob influência do álcool – em 2010, o quarteto foi encaminhado para uma das Casas de Passagem de Natal, instituição que acolhe crianças e adolescentes de 0 a 17 anos de idade em situação de risco pessoal e social, de ambos os sexos, e em caráter provisório e excepcional. A estada nas Casas é, realmente, temporária. Ao completar 18 anos, eles têm de enfrentar a dura realidade de ter que sair da Casa. Para quem não tem família nem suporte algum, isso é bem mais doloroso e difícil. Não são raros os casos dos que acabam entrando no mundo das drogas e violência.
Foi neste ambiente que os pequenos passaram longos 45 dias longe do pai, da mãe, dos tios, dos primos, da família. Apesar de bem assistidos pela equipe da Casa de Passagem, nada substitui os laços familiares. Ao vê-los nesta situação – esperando por uma adoção que poderia aparecer, ou não – a professora de ensino fundamental Margareth Medeiros, irmã da mãe das crianças, com dois filhos adultos e avó, resolveu adotá-los, e se transformar numa tia-mãe. “Quando eu ia visitá-los e os via lá, sozinhos, praticamente abandonados pela família, eu não agüentava. Não podia deixar eles lá”, lembra ela, com muita tristeza.
Com o aval da progenitora dos garotinhos, ela reuniu forças para ir à 1ª Vara da Infância e solicitar a guarda deles. Passada a audiência, as certidões originais de nascimento deles foram canceladas, e agora eles possuem novas certidões, com o nome da nova mãe. Há dois anos, os pequeninos finalmente recebem todos os dias o que toda criança precisa: afeto. “Eles são muito amorosos. Cada momento, cada conquista, é uma felicidade”, conta a professora, emocionada.
Porém, ela enfatiza que só amor não é suficiente. “Quem quer adotar tem que ter muito amor, mas também muita paciência e condições financeiras”, aconselha Margareth, que já passou por sérias dificuldades a ponto de recorrer à ajuda governamental para sustentar a nova prole – mas nem por isso desistiu.
A adoção não deve ser feita por caridade ou por pena, mas por amor. É a melhor opção para que uma criança tenha uma vida digna tal como merece: com uma família que te dê proteção, carinho e principalmente, amor.
O processo não é nada simples, e os critérios são rigorosos. Tanto que de 2009 para cá, o número de pedidos de adoções na 2ª Vara da Infância e Juventude de Natal declinou pela metade.
O juiz Sérgio Roberto Nascimento Maia, que tem a competência de apreciar pedidos de adoção, credita essa queda a uma mudança brusca na legislação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ocorrida em novembro de 2009, que afunilou as regras para os interessados em adotar.
O principal é que a partir desta mudança, para requerer uma adoção é preciso enfrentar uma fila de espera. Hoje, a lista de espera acumula 118 inscritos, entre casais casados ou com união estável e solteiros.
A fila obedece à ordem cronológica – conforme o perfil escolhido da criança, por idade e sexo. Os postulantes também passam por uma triagem e participam de cursos de habilitação e avaliações psicológicas e jurídicas.
Há, entretanto, três exceções à regra, que abrem uma brecha para ‘furar’ a fila: quando se é parente consangüíneo da criança, quando se está com ela há mais de três anos e para quem adota filhos do marido ou companheiro.
Soma-se a outro fator: nem todas as crianças e adolescentes que residem em abrigos podem ser adotados. Para isso, é preciso se encaixar em quatro possibilidades: os pais biológicos terem falecido; serem desconhecidos; terem perdido o poder familiar; ou concordem com a adoção.
“As pessoas têm relutado em aceitar a mudança de postura e precisamos mudar esta mentalidade. Eu comparo a uma fila de doação de órgãos. As pessoas precisam ter consciência de que é necessária toda orientação possível, e o processo ficou mais qualificado. Depois que você adota, é irrevogável, não pode voltar atrás. É uma decisão que afeta toda a família. Nesta modalidade, os adotantes se sentem mais valorizados, porque a adoção é democrática, não tem cunho financeiro”, ressalta o juiz.
Estão habilitados a adotar maiores de 18 anos com uma diferença de, no mínimo, 16 anos entre a pessoa e a criança. Quem é avô ou irmão da criança fica impedido de adotá-la, pois isso geraria uma confusão na mente infantil sobre os papéis familiares.
“O nosso interesse é o bem estar da criança”, enfatiza Sérgio Maia. Tendo esta meta como norteadora, o jurista justifica que não há restrição a adoção homoafetiva – desde que obedeçam às exigências.
“O fato de ser homossexual não interfere diretamente na escolha sexual da criança. O importante é que ela se desenvolva de forma sadia e estável”, opina o juiz. O número ainda é pequeno: dos 118 interessados em adotar na 2ª Vara de Natal, apenas um casal é do mesmo sexo.
A adoção por casais do mesmo sexo está longe de ser a maior preocupação para o juiz. O que gera apreensão é as 32 crianças que anseiam ser adotadas – uma espera longa e sem expectativas. Isso porque elas estão dentro de um perfil que ninguém quer adotar: ou são maiores de 10 anos, ou possuem alguma deficiência física ou mental. No Cadastro Nacional de Adoção, existem 26 mil crianças nesta situação.
O futuro dessas crianças, tristemente, não é nada promissor. Ao completar 18 anos, elas são obrigadas a abandonar o abrigo. “Elas saem do abrigo duplamente rejeitados: pela família biológica e pela sociedade. A partir daí é um efeito dominó. Ficam revoltados e acabam procurando amparo nas drogas”, lamenta o juiz.
É possível escrever uma nova história para as crianças em abrigos – e como todo conto infantil: com um final feliz.
Na 2ª Vara da Infância e Juventude, situada no Fórum Miguel Seabra Fagundes, em Lagoa Nova, há um cadastro de pretendentes à adoção. Para preencher esse cadastro, é preciso providenciar uma série de documentos:
– Identidade e CPF
– Certidão de casamento ou certidão de nascimento
-Comprovante de residência
-Comprovante de renda
-Certidão negativa de antecedentes criminais (obtida na Justiça Estadual ou Justiça Federal)
-Declaração de idoneidade moral
-Fotografias dos pretendentes, da residência e da família destes
-Atestado de sanidade mental, expedido por psiquiatra ou clínico geral
-Requerimento fornecido pela 2ª Vara da Infância e da Juventude
Em seguida, o postulante irá passar por um Curso Pré-Natal da Adoção, composto por encontros temáticos que visam levá-lo a refletir acerca de temas relacionados à adoção, e preparando-o para dar a segurança necessária para que o acolhimento do filho adotivo aconteça com tranqüilidade.
Junto com os pais adotivos, a criança ou adolescente recebem acompanhamento de assistentes sociais e psicólogos que vão preparar a família para o acolhimento e buscar formar laços de ligação afetiva entre o adotado e os seus novos pais. A adoção precisa ser mútua.
DIREITOS DOS PAIS ADOTIVOS
– O pai adotivo tem direito à licença paternidade de cinco dias
– A mãe adotiva também tem direito à licença maternidade, proporcional à idade do adotado
ADOTAR SEM REGISTRO É CRIME
Não é correto buscar crianças ou adolescentes em comunidades pobres ou abordar gestantes nas ruas ou em maternidades. É crime registrar como filho alguém nascido de outra pessoa sem antes passar pelo processo de adoção. Quem adota sem ter passado por esse processo está sujeito a perder a criança.
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