STF libera aborto de anencéfalos – No RN casos são comuns

13 de abril de 2012

NO RIO GRANDE do Norte, só na Maternidade Escola Januário Cicco, são homologados por ano cerca de cinco processos de gestações com anencefalia, quando há má formação do cérebro do feto. Dos casos já registrados, em quase 100% as mães optaram pelo aborto e garantiram o direito do procedimento na justiça. Outras, deram continuidade à gravidez mas perderam o filho em poucas horas.

As informações são da diretoria clínica da Januário Cicco e provam que, independente da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou o aborto nos casos em que há a patologia, mostra que a interrupção da gravidez é o caminho mais tomado no Estado.

Maternidade Januário Cicco realiza, em média, cinco abortos de fetos anencéfalos por ano

Maternidade Januário Cicco realiza, em média, cinco abortos de fetos anencéfalos por ano

No Januário Cicco, de acordo com a diretora Maria Daguia de Medeiros, no momento em que a anencefalia é identificada, o médico que acompanha a grávida, explica tudo sobre a patologia e mostra os riscos que a mãe pode ter em dar continuidade à gestação. De acordo com a médica, os problemas mais comuns são a elevação da pressão arterial e polidrâmnio, que é o excesso que liquido amniótico. Esta alteração pode levar a mãe à morte.

Um fator que pesa muito na decisão das mães para o aborto é a certeza de que a criança não sobreviverá. A médica obstetra Kívia Mota lembrou do caso de uma mãe que disse se sentir um caixão, por carregar uma criança que ela sabia que não ia sobreviver.

Kívia lembrou ainda que o diagnóstico da gestação de uma criança com má formação no cérebro é muito fácil de ser feito. Já o trâmite até o aborto é que não é tão simples. “E algumas mães acham tão difícil, que elas mesmo provocam o aborto clandestinamente”, revelou. Estas situações, segundo ela, são mais comuns nos casos descobertos em clínicas particulares.

Por outro lado, a religiosidade é o que faz algumas mães optarem por manterem a gravidez mesmo sabendo do problema da criança. Todas as doutrinas cristãs defendem que o feto anencéfalo é uma vida e, independete de qualquer outro fator, deve ser tratado como tal. No Januário Cicco, de acordo com a diretoria, nunca uma criança se manteve viva por além de minutos, mas em outros hospitais há relatos mais otimistas.

De acordo com a diretoria do Hospital Santa Catarina, o segundo maior da capital, há o caso de um bebê que sobreviveu 5 meses. E a mãe desta criança fez de tudo para mantê-la viva o máximo possível de tempo. A alimentação era feita com a ajuda dos médicos.

ADVOGADA DEFENDEU DIREITO DE CLIENTE GRÁVIDA DE FETO ANENCÉFALO

Em 2006 a decisão foi fácil . Procurada por uma mulher de 30 anos grávida de um bebê anencéfalo, a advogada Eveline Macedo Leite, de imediato, impetrou uma ordem de Habeas Corpus Preventivo com pedido de limiar solicitando a permissão para o aborto. Agora, com 33 semanas de gestação do segundo filho e declaradamente contra o aborto, Eveline já não tem tanta certeza se tomaria a mesma decisão de 6 anos atrás.

O caso defendido por Eveline foi um dos primeiros dos quais se tem notícia no estado. E em apenas uma semana, a senhora grávida já estava realizando o procedimento com o aval da justiça e com parecer do Ministério Público.

Quando pegou o caso, único deste tipo em sua carreira profissional, Eveline conta que encarou como desafio. “Estava saindo ainda da Universidade e este era um assunto muito arenoso. Peguei para saber se eu tinha chance mesmo de conseguir”, explicou.

Hoje, atuando na área empresarial, Eveline explica que como o assunto era muito delicado, procurou promotor e juiz para conversar pessoalmente. Com o promotor, a negociação foi mais fácil porque além de formado em direito, ele era médico e conhecia todos os prováveis danos que a gravidez poderia levar à mãe. Já com o juiz, havia uma barreira maior, porque, por convicções pessoais e religiosas, o magistrado era contra o aborto em qualquer circunstância.

Neste caso específico a crença pessoal não interferiu, mas a advogada acredita que essa subjetividade pode continuar pesando nas
decisões da justiça. “Como o juiz decide por convicção, de forma intima, ele vai continuar levando em  consideração isso. Agora, fica fragilizado diante de uma posição do STF”, ressaltou.

‘A decisão favorável do Supremo sobre a descriminalização do aborto para esta patologia vai facilitar para que as mães que tenham esta gravidez sejam reconhecidas de forma mais simplificada, sem embaraço e sem complicação. “Se já existe um precendente do STF, que é a nossa corte suprema, autorizando e afirmando que não se trata de crime,  fica muito mais fácil”, explicou.

E apesar deste passo na discussão pró-aborto, Eveline não acredita que haja a descriminalização completa da interrupção da gravidez. Numa situação dessas, que corre o risco a mãe e corre o risco o bebê é essa polêmica toda, que desde 2004 está rolando isso e agora que está se chegando a uma conclusão, imagine a descriminalização do aborto.

Para Eveline defender o caso de outra mulher grávida de uma criança com má formação do cérebro, na situação de hoje, o que poderia pesar na decisão era a solidariedade com a frustração desta grávida. “Eu estou falando com você agora e estou sentindo o bebê mexer, mas eu fico imaginando uma mãe sentindo uma criança mexer, sabendo que não vai poder cuidar”, ressaltou.

MOVIMENTO BRASIL SEM ABORTO

Independente da decisão já dada como certa da Corte, os casos dos fetos anencefálicos ainda deve gerar muita discussão. Alguns especialistas defendem que o feto com má formação cerebral oferece riscos de vida à mãe. Para Cleber Costa, coordenador estadual do Movimento Brasil sem Aborto, a interrupção da gravidez nesse caso é “pura forçação de barra”. “Quem diz que há risco para a mãe age de má fé ou é desinformado e está sendo irresponsável por falar sobre uma coisa que não sabe” ressaltou.

Cleber Costa, coordenador estadual do Movimento Brasil sem Aborto

Cleber Costa, coordenador estadual do Movimento Brasil sem Aborto

De acordo com Costa, o STF está trantando o bebê anencéfalo como uma vida sem perspectiva e que, por isso, precisa ser anulada. Mas segundo ele, isso não é verdade. Ele contou casos de crianças que já viveram até dois anos e meio. E para Cleber, o erro do STF começa na interferência sobre a lei. Segundo ele essa é uma decisão que caberia apenas ao poder legislativo.

Costa teme que esta decisão seja apenas mais um passo para que se chegue a descriminalização generalizada do aborto. Ele afirma que essa é a consequencia natural, logo “este grupo que torce por isso vai continuar encontrando um jeito até chegar a esse fim. Mas vai ser
de conta-gotas. Não tem como ser tudo de uma vez”, ressaltou.

A decisão do Supremo, para o cordenador do movimento contra o aborto, vai condenar todas as crianças anencéfalas do País à morte. Salvo exceções de algumas mães que, por suas convicções religiosa, optam por dar continuidade à gravidez.

RELIGIÕES JUNTAS CONTRA DECISÃO DO STF

As religiões cristãs (católica, evangélica e espírita) esquecem as divergências doutrinárias para comungar um entendimento em comum: são declaradamente contra o aborto. E para todas estas doutrinas, o ser já é vida a partir da concepção e a gravidez não deve ser interrompida sob nenhuma hipótese.

“Horas após a fecundação já existe o embrião, e lá já estão todas as informações a respeito daquele ser. Todas as características”, ressaltou o pastor da Assembléia de Deus de Parnamirim, Elinaldo Renovato. Para o pastor, as gestações não devem ser interrompidas sequer em casos de estupro, que já foi descrimanilzado há certo tempo. “A Bíblia diz que só o próprio Deus pode tirar a vida”, ressaltou.

O mesmo defende Cleber Costa, que também é assessor de relações institucionais da Federação Espírita do Rio Grande do Norte. Ele acrescenta que todas as pessoas tem uma missão no mundo e até as crianças com anencefália devem ter o direito de cumprir o seu papel para que possam evoluir. “Como espírita, eu não lamento pela decisão do STF. Eu peço que Deus tenha misericórdia deles”, ressaltou.

Já o Vigário Geral da Arquidiocese de Natal, Edilson Nobre, ai rmou que a Igreja mantém a convicção de que, ainda com anencefalia, o feto continua sendo uma vida. E para simbolizar o posicionamento, a Igreja Católica realizou um dia de vigília ante-ontem em todo o País. “Através deste grande momento de oração, nós manifestamos a nossa opinião”.

 

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